As audiências eram para Dom Bosco uma cruz torturante e meritória. Muitas vezes sujeitava-se a um sério desconforto físico: com saúde frágil, com problemas de estômago, sujeito a sérias inflamações, devia continuamente falar forte. Depois de um tempo sentia como que faltar a respiração… Às vezes ficava tão cansado que nem mais se escutava sua voz… Mas ele continuava sua penosa ocupação. O padre José Oreglia SJ, afirmava que se Dom Bosco não tivesse feito outra penitência em sua vida, esta seria suficiente para se declarar a heroicidade da sua virtude.
Realmente a vida de Dom Bosco foi um contínuo dar atenção às pessoas onde quer que se encontrasse. A quem o aconselhava a desistir disso, dizia:
‑ Não é conveniente, não tenho coragem, é gente pobre, muitos vêm de longe. Coitados: ficam tanto tempo na sala de espera, sinto compaixão dele; depois, é uma oportunidade de fazer um pouco de bem.
E não faltava uma brincadeira. Alguém lhe perguntava:
‑ Não tem um jeito para diminuir esse martírio de tantas audiências que na verdade são inúteis?
‑ Oh, sim, dizia. Claro que haveria um meio para libertar-me de tanta gente!
‑ E qual?
‑ Com certeza! Bastaria que eu me fingisse de louco e idiota: as pessoas deixariam de vir! Mas este meio seria reprovável e prejudicial para a nossa Congregação, porque nós precisamos de todos.
Um dia os clérigos exortaram-no a fixar um horário de atendimento para não receber em qualquer momento… Respondia:
‑ Eh! Deus nos colocou neste mundo para os outros.
Por isso recomendava aos seus colaboradores a vida de contínuo sacrifício para o bem do próximo. Exortava-os a não descuidar de atender as pessoas para praticar a caridade…
Falava que deviam ter grande cuidado em não despedir alguém descontente. Dizia ao secretário:
‑ Procure contentar todo mundo, como faz Dom Bosco. Nestas ocasiões, a calma, sem nenhuma aspereza, elimina ou diminui bastante uma impressão desagradável. Mas para conseguir este efeito é necessária uma preparação: oração, madura reflexão, amabilidade, junto com grande paciência e amor à verdade.
No mais, clérigos, padres e alunos recebiam constantes lições práticas de acolhida frutuosa cada vez que iam ao seu aposento conversar com ele.
Essa página fala por si. A importância do acolher, ouvir, atender com paciência e sacrifício. Que o digam os especialistas da medicina alternativa e da psicologia, terapeutas em geral, acompanhantes espirituais e confessores… O exemplo de nosso Pai e Mestre é paradigmático!
Anselm Grün, em seu livro Reencontrar a própria alegria, nos fala de uma pesquisa americana de 1997 cuja constatação é: pessoas que ajudam outras se sentem mais saudáveis do que outras pessoas da mesma faixa etária; quem ajuda os outros sente em si calor repentino, aumento de energia e sentimento de euforia. Aliás, foi o próprio Senhor Jesus quem disse: Há mais alegria em dar do que em receber.
Rubem Alves, em seu famoso texto A Escutatória nos diz: “É chegado o momento, não temos mais o que esperar. Ouçamos o humano que habita em cada um de nós e clama pela nossa humanidade, pela nossa solidariedade, que teima em nos falar e nos fazer ver o outro que dá sentido e é a razão do nosso existir, sem o qual não somos e jamais seremos humanos na expressão da palavra”.
Padre Osmar A. Bezutte, SDB, é revisor da nova tradução das Memórias Biográficas de São João Bosco (Editora Edebê).