Fato é que, qualquer que seja a análise feita sobre as famílias, que são unidas por laços de sangue e/ou do casamento, não podemos nunca esquecer da família de Cristo, unida pela fé e vivenciada verdadeiramente na unidade entre os cristãos.
Essa análise é muito importante, seja para a promoção da unidade entre os povos, seja para o enfrentamento e a superação de diversos problemas sociais e globais, a partir do respeito mútuo e da colaboração recíproca.
Nasce, então, a necessidade de nós, cristãos, cultivarmos de maneira cada vez mais profunda e frequente, em qualquer de nossas relações sociais, um respeitoso diálogo ecumênico e, também, inter-religioso.
Ecumenismo e diálogo inter-religioso
Importante ressalvarmos, desde logo, as diferenças entre “ecumenismo” e “diálogo inter-religioso”, cujas questões tanto nos têm sido colocadas pelo Papa Francisco.
O ecumenismo se constitui em um processo de diálogo e cooperação voltado a promover a unidade entre os cristãos, de todas as confissões e religiões, mas, necessariamente, praticantes da Palavra de Cristo. A palavra vem do grego, e significa “todo o mundo habitado”. No cristianismo, seu sentido principal é o de cumprir o desejo do próprio Cristo Jesus, de que todos nós sejamos “um só povo” (Jo 17, 21-23).
Já o diálogo inter-religioso constitui-se de uma ferramenta de aproximação com as diversas religiões do mundo, cristãs ou não. É uma maneira de anunciar nossa fé, transformando o espaço de “diálogo” em algo muito mais profundo do que a mera troca de informações entre as religiões: trata-se de um espaço de anúncio evangélico.
É importante deixar claro desde já que o diálogo inter-religioso não é espaço para tentarmos “converter” outras pessoas à nossa fé, ou seja, tentar trazer o outro para a nossa Igreja. Fazemos essa tarefa por vivência de nossa fé, e não por imposição.
Pontes , em vez de muros
A questão da necessidade de um diálogo ecumênico e inter-religioso, para a Igreja, ganhou grande relevância a partir do Concílio Vaticano II, cujos documentos orientam a relação entre o diálogo e a missão do cristão-católico.
O secretário do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso do Vaticano, dom Miguel Ángel Ayuso, em seu discurso para ao Movimento dos Focolarinos, afirmou: “Não é exagerado dizer que o Papa Francisco não passa um dia sem fazer referência à importância do diálogo inter-religioso”.
“Todo o ensinamento do Papa Francisco é um a exortação a construir pontes e não muros, a olhar com misericórdia para a vida dos outros, a ter compaixão pelo pobre, a trabalhar juntos pelo bem da nossa casa comum que é a Criação”, declarou.
Vejamos, então, que o convite do Papa em praticarmos o ecumenismo e o diálogo inter-religioso constitui-se em importante ferramenta para construirmos pontes e derrubarmos muros. Esse é o caminho para o respeito recíproco entre os diversos povos do mundo, e, finalmente, para o consenso.
Somente através do respeito à dignidade do próximo é que se torna possível superar a violência, porque esta deriva diretamente da indiferença, em todas as suas formas de expressão.
Respeito e tolerância religiosa
Nesses termos, e por tal razão, a religião (a nossa, a do outro, enfim, todas) deve ser mecanismo de inclusão, de busca do outro, de transcender as barreiras do individualismo. Quando a religião vira instrumento de perpetuação de interesses pessoais, de egoísmo, passa a ser mais uma ferramenta de guerra e divisões.
Enquanto “bons cristãos e honestos cidadãos”, como desde logo nos ensinava e pedia Dom Bosco, devemos também estar atentos às ferramentas sociais para inclusão e promoção do respeito e da tolerância religiosa.
Aparentemente, vemos crescer a intolerância religiosa e o desrespeito às figuras de religiões, como, por exemplo, de matriz africana. Mas, como cidadãos politicamente ativos e participativos, o que temos feito para cobrar dos poderes públicos mais e melhores instrumentos de proteção social? E as políticas públicas voltadas à inclusão e ao respeito de diversas religiões no seio da sociedade? Existem? Se sim, são eficazes?
É preciso, alinhado ao discurso do Santo Padre, além de caminharmos em direção ao diálogo, começarmos a nos preocupar com a inclusão e o respeito de diversos irmãos e irmãs, de nossa própria religião e, também, de outras.
Caminhada conjunta
E é por isso que, além de pensar nas uniões e nas famílias modernas, devemos pensar em nossa própria família cristã, em um pensamento muito mais “global” do que normalmente se discute. Sem perdermos nossa essência, o diálogo é sempre o melhor instrumento para uma caminhada conjunta, e, portanto, para uma sociedade cada vez mais justa, inclusiva, fraterna e solidária.
Que possamos viver a sábia lição de Santo Agostinho, sintetizada em suas palavras: “Nas coisas essenciais, a unidade; nas duvidosas, a liberdade; e, em tudo, a caridade”.
Iago Rodrigues Ervanovite, 23 anos, é advogado, formado pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo, secretário nacional da Pastoral da Juventude Estudantil (PJE) e membro da Coordenação da Pastoral Juvenil Nacional da CNBB.