No outono de 1863, Dom Bosco tinha aberto o pequeno seminário São Carlos em Mirabello. Como diretor, tinha escolhido o padre Miguel Rua, de 26 anos, um dos seus primeiros e mais valiosos colaboradores. Para apoiá-lo na sua difícil tarefa de diretor de uma comunidade de irmãos, Dom Bosco lhe enviou por carta com “26 pontos ou avisos”, sob a forma de conselhos práticos e espirituais. O conteúdo desta carta, integrado e ampliado por sucessivos acréscimos, foi publicado em 1886, assinado por Dom Bosco, como “Lembranças confidenciais aos Diretores das casas”. Nesta redação, última e definitiva, os “26 pontos” originais atingiram o número de 47.
Mensagem profética
Nestas lembranças, Dom Bosco traçava os princípios inspiradores e as linhas de comportamento que deviam animar o diretor de uma casa salesiana com todos os seus membros no exercício de suas tarefas específicas e com os externos, como se depreende dos vários capítulos:
- Contigo mesmo.
- Com os professores.
- Com os assistentes e chefes de dormitório.
- Com os colaboradores e as pessoas de serviço.
- Com os jovens alunos.
- Com os externos.
- Com os membros da sociedade.
- Ao dar ordens.
Tratava-se de lembranças simples e concretas. Mais do que inspirar-se em fontes redacionais externas, Dom Bosco as tinha deduzido das experiências pedagógicas e espirituais de fraternidade, de corresponsabilidade e de percepções, cultivadas e amadurecidas por ele em Valdocco, em contato com seus colaboradores e jovens. Essas lembranças focalizavam particularmente o espírito de família que Dom Bosco desejava que florescesse e se difundisse em todas as comunidades salesianas.
Com o passar dos anos, as “Lembranças aos Diretores” se tornaram um texto clássico da tradição salesiana; com justiça, começaram a fazer parte das coleções antológicas de escritos pedagógicos ou espirituais de Dom Bosco, às quais se referem todos os membros da Família Salesiana.
Não basta amar, é preciso saber “fazer-se amar”
Entre os conselhos sugeridos por Dom Bosco ao padre Rua na carta de 1863, destacava-se o seguinte: “Procura fazer-te amar antes de te fazer temer”. Estas palavras foram as últimas que o padre Rua ouviu dos lábios de Dom Bosco, dirigidas a ele no leito de morte (Memórias Biográficas XVIII, 237).
A origem dessa fórmula se relaciona com uma expressão originária – “mais de amor do que de temor” – que se encontra na regra de Santo Agostinho. Ela foi retomada nas regras de São Bento e de outras Ordens Religiosas, nas Constituições da Companhia de Jesus e de outras congregações religiosas e em escritos que tratam da importância da educação preventiva e não repressiva. Isto sublinha que, nas relações humanas, o amor deve prevalecer sobre o temor.
Um amor que vem do Alto
Este princípio vital assinala, orienta e permeia todo o conteúdo da carta. Pressupõe um amor que vem do Alto. Com efeito, Dom Bosco recomendava ao padre Rua que se empenhasse em exercer a sua função de superior, indicando: “A caridade e a paciência te acompanhem constantemente ao dar ordens; faze com que cada uma das tuas ações e das tuas palavras revelem que procuras o bem das almas. Tolera qualquer coisa quando se trata de impedir o pecado. Tuas solicitudes sejam direcionadas ao bem do espírito, da saúde e da ciência dos jovens confiados a ti pela Divina Providência”.
Aqui se acentuava o fato de que o padre Rua devia dedicar-se de modo tal ao serviço dos subalternos que os levasse a compreender que agia assim não por algum interesse pessoal, mas com dedicação e afeto unicamente para o bem deles. Por isso eles mesmos, de algum modo, deviam sentir-se solicitados a acolher e valorizar o que lhes era dado. Portanto, não bastava amar; era preciso saber fazer-se amar.
Na realidade, Dom Bosco propunha ao padre Rua um modo de desempenhar sua missão de guia e de animação dos irmãos e dos jovens, inspirado na caridade e na colaboração, a fim de envolvê-los na própria formação e na edificação da comunidade, mais como irmão e amigo do que como superior.
Padre Agostino Favale, SDB, é professor emérito de História da Igreja Moderna e Contemporânea e de Espiritualidade da Universidade Pontifícia Salesiana de Roma, consultor da Congregação para a Causa dos Santos e autor de mais de 180 obras.
Tradução: Padre Angelo Dante Biz, SDB.