Juventude e Amazônia: e eu com isso?

Segunda, 09 Novembro 2015 18:55 Escrito por  Iago Rodrigues Ervanovite
Juventude e Amazônia: e eu com isso? Foto: ISMA
Evangelizar perpassa necessariamente por um envolvimento intenso nas questões sociais. Mas temos nos preocupado com a situação social de nossos irmãos indígenas?

A presença salesiana nas comunidades indígenas na Amazônia brasileira, por meio das “Missões do Rio Negro”, completa, em 2015, 100 anos de dedicação a serviço da evangelização no Norte do país.

Evangelizar, espalhar a Palavra de Deus, como missão que é passada inclusive a nós, jovens (Jr 1, 4-8), exige necessariamente um envolvimento intenso nas questões sociais. Afinal, como nos lembra o Papa Francisco, “ser cidadão fiel é uma virtude, e a participação na vida política é uma obrigação moral” (EG, 220).

Temos nos preocupado com a situação social de nossos irmãos indígenas?

De acordo com o site Brasil Escola, “são chamados índios os habitantes das Américas no período em que estas foram descobertas pelos europeus e assim denominados permaneceram ao longo do tempo”. Estima-se que, à época do descobrimento, o Brasil era ocupado por cinco milhões de índios. Porém, com a crescente exploração das riquezas do território nacional pelos povos europeus, este número foi reduzido drasticamente. Hoje, existem cerca de 370 mil índios espalhados pelo país, sendo que cerca de 190 mil deles estão na região Norte.

 

Exploração

A ocupação do território nortista do país para a exploração comercial é prática constantemente observada pela mídia, não apenas por parte daqueles que buscam o extrativismo vegetal (com a derrubada de árvores para plantio de soja, milho e outros vegetais), mas também por fontes de garimpo ilegal.

Como exemplo, “em 2004, a reserva Roosevelt, pertencente aos cintas-largas que se localiza entre Rondônia e Mato Grosso, foi invadida por garimpeiros quando estes descobriram que a região era a maior reserva de diamantes do mundo e que poderia fornecer um milhão de quilates por ano”. Esta invasão resultou em conflito sangrento, em que muitos índios e garimpeiros foram mortos; aqueles, para defesa de suas terras, e estes, para defesa de seus interesses econômicos.

A rede internacional de exploração ilegal das riquezas amazônicas tem arrecadado cerca de US$ 800 milhões anuais, à custa da vida de centenas de índios (aproximadamente 140 por ano, por estimativa do CIMI - Conselho Indigenista Missionário), e da depredação do solo amazônico.

Além disso, o modelo agrário que tem se desenvolvido no país, mesmo que na esfera da legalidade, tem afetado radicalmente a vida das comunidades indígenas.

 

Demarcação de terras

A Constituição Federal de 1988 deixou a cargo do Poder Executivo Federal os processos para demarcação de terras, com o intuito de resguardar os traços das comunidades originárias. Contudo, a lentidão dos processos administrativos e a ausência de fiscalização por parte do Estado, fazem com que grileiros, posseiros e o agronegócio se apropriem indevidamente de terras que, em tese, são de propriedade dos índios, para exploração de suas atividades empresariais. Desses conflitos, inexorável e infelizmente, decorrem muitas mortes inocentes.

Os grandes fazendeiros passaram, então, a apostar no lobby no Congresso Nacional para aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que pretende mudar a forma como as demarcações de terras indígenas são feitas, deixando de ser atribuição do Poder Executivo, passando a ser feitas pela Câmara dos Deputados. Na visão dos indigenistas, juristas e antropólogos, porém, a proposta é negativa, pois pararia completamente os processos de demarcações de terras, e acentuaria os conflitos no campo.

 

O exemplo de Jesus

Toda essa conjuntura social não parece nos abalar; sequer temos notícia destes acontecimentos. E, se temos, não damos a merecida importância.

Mas, diante dessa situação, como se comportaria Jesus de Nazaré? Filho de Deus, camponês, pobre, que sempre esteve ao lado daqueles que são socialmente excluídos e marginalizados (cf. Mt 8; Jo 4; e Jo 8), Jesus deu a vida para nos libertar (Gl 5, 1).

Conhecemos, nós, os mártires que deram a vida para a libertação dos povos do campo? Como nos marcou, por exemplo, a morte de Ir. Dorothy Stang, irmã missionária, enquanto cristãos?

“Por que temeis, homens de pouca fé?” (Mt 8, 26).

Pois, se todos “sabemos que toda a criação geme em dores de parto até agora” (Rm 8, 22), enquanto não nos importarmos com as lutas dos irmãos e irmãs do campo, de nada adiantarão nossos trabalhos de evangelização que visem apenas e tão somente as questões espirituais, e se esqueçam da libertação dos povos (Ex 6, 6).

Lembremo-nos, pois: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças” (Papa Francisco).

 

Iago Rodrigues Ervanovite é secretário nacional da Pastoral da Juventude Estudantil (PJE), estudante de Direito pelo Centro UNISAL de Lorena, pesquisador-bolsista do CNPq e membro da Coordenação da Pastoral Juvenil Nacional da CNBB.

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Última modificação em Segunda, 09 Novembro 2015 19:51

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Juventude e Amazônia: e eu com isso?

Segunda, 09 Novembro 2015 18:55 Escrito por  Iago Rodrigues Ervanovite
Juventude e Amazônia: e eu com isso? Foto: ISMA
Evangelizar perpassa necessariamente por um envolvimento intenso nas questões sociais. Mas temos nos preocupado com a situação social de nossos irmãos indígenas?

A presença salesiana nas comunidades indígenas na Amazônia brasileira, por meio das “Missões do Rio Negro”, completa, em 2015, 100 anos de dedicação a serviço da evangelização no Norte do país.

Evangelizar, espalhar a Palavra de Deus, como missão que é passada inclusive a nós, jovens (Jr 1, 4-8), exige necessariamente um envolvimento intenso nas questões sociais. Afinal, como nos lembra o Papa Francisco, “ser cidadão fiel é uma virtude, e a participação na vida política é uma obrigação moral” (EG, 220).

Temos nos preocupado com a situação social de nossos irmãos indígenas?

De acordo com o site Brasil Escola, “são chamados índios os habitantes das Américas no período em que estas foram descobertas pelos europeus e assim denominados permaneceram ao longo do tempo”. Estima-se que, à época do descobrimento, o Brasil era ocupado por cinco milhões de índios. Porém, com a crescente exploração das riquezas do território nacional pelos povos europeus, este número foi reduzido drasticamente. Hoje, existem cerca de 370 mil índios espalhados pelo país, sendo que cerca de 190 mil deles estão na região Norte.

 

Exploração

A ocupação do território nortista do país para a exploração comercial é prática constantemente observada pela mídia, não apenas por parte daqueles que buscam o extrativismo vegetal (com a derrubada de árvores para plantio de soja, milho e outros vegetais), mas também por fontes de garimpo ilegal.

Como exemplo, “em 2004, a reserva Roosevelt, pertencente aos cintas-largas que se localiza entre Rondônia e Mato Grosso, foi invadida por garimpeiros quando estes descobriram que a região era a maior reserva de diamantes do mundo e que poderia fornecer um milhão de quilates por ano”. Esta invasão resultou em conflito sangrento, em que muitos índios e garimpeiros foram mortos; aqueles, para defesa de suas terras, e estes, para defesa de seus interesses econômicos.

A rede internacional de exploração ilegal das riquezas amazônicas tem arrecadado cerca de US$ 800 milhões anuais, à custa da vida de centenas de índios (aproximadamente 140 por ano, por estimativa do CIMI - Conselho Indigenista Missionário), e da depredação do solo amazônico.

Além disso, o modelo agrário que tem se desenvolvido no país, mesmo que na esfera da legalidade, tem afetado radicalmente a vida das comunidades indígenas.

 

Demarcação de terras

A Constituição Federal de 1988 deixou a cargo do Poder Executivo Federal os processos para demarcação de terras, com o intuito de resguardar os traços das comunidades originárias. Contudo, a lentidão dos processos administrativos e a ausência de fiscalização por parte do Estado, fazem com que grileiros, posseiros e o agronegócio se apropriem indevidamente de terras que, em tese, são de propriedade dos índios, para exploração de suas atividades empresariais. Desses conflitos, inexorável e infelizmente, decorrem muitas mortes inocentes.

Os grandes fazendeiros passaram, então, a apostar no lobby no Congresso Nacional para aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que pretende mudar a forma como as demarcações de terras indígenas são feitas, deixando de ser atribuição do Poder Executivo, passando a ser feitas pela Câmara dos Deputados. Na visão dos indigenistas, juristas e antropólogos, porém, a proposta é negativa, pois pararia completamente os processos de demarcações de terras, e acentuaria os conflitos no campo.

 

O exemplo de Jesus

Toda essa conjuntura social não parece nos abalar; sequer temos notícia destes acontecimentos. E, se temos, não damos a merecida importância.

Mas, diante dessa situação, como se comportaria Jesus de Nazaré? Filho de Deus, camponês, pobre, que sempre esteve ao lado daqueles que são socialmente excluídos e marginalizados (cf. Mt 8; Jo 4; e Jo 8), Jesus deu a vida para nos libertar (Gl 5, 1).

Conhecemos, nós, os mártires que deram a vida para a libertação dos povos do campo? Como nos marcou, por exemplo, a morte de Ir. Dorothy Stang, irmã missionária, enquanto cristãos?

“Por que temeis, homens de pouca fé?” (Mt 8, 26).

Pois, se todos “sabemos que toda a criação geme em dores de parto até agora” (Rm 8, 22), enquanto não nos importarmos com as lutas dos irmãos e irmãs do campo, de nada adiantarão nossos trabalhos de evangelização que visem apenas e tão somente as questões espirituais, e se esqueçam da libertação dos povos (Ex 6, 6).

Lembremo-nos, pois: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças” (Papa Francisco).

 

Iago Rodrigues Ervanovite é secretário nacional da Pastoral da Juventude Estudantil (PJE), estudante de Direito pelo Centro UNISAL de Lorena, pesquisador-bolsista do CNPq e membro da Coordenação da Pastoral Juvenil Nacional da CNBB.

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