A missão de ajudar os jovens na descoberta da própria vocação

Domingo, 20 Agosto 2023 17:35 Escrito por 
O que é vocação? Por que é importante apoiar os jovens no discernimento vocacional? E qual é a missão da Família Salesiana no acompanhamento para que cada jovem descubra o caminho de felicidade que Deus traçou em sua vida? Essas são algumas das questões refletidas nesta entrevista com a irmã Cleonice Aparecida Lourenço (Ir. Nice).  

Irmã Cleonice Aparecida Lourenço, a Irmã Nice, tem 51 anos de idade e 25 como Filha de Maria Auxiliadora (FMA). Atualmente, ela é responsável, na Inspetoria Nossa Senhora Aparecida (BAP) pela Animação Vocacional, pela Animação Missionária e pela Articulação da Juventude Salesiana (AJS). Nesta entrevista ao Boletim Salesiano, Ir. Nice dá o seu testemunho sobre como esses três serviços estão interligados, sobre a necessidade de falar aos jovens a respeito da vocação como resposta a um chamado de Deus para a vida e sobre o que pensa da missão da Família Salesiana no acompanhamento vocacional das juventudes. Confira!

 

Qual é o seu trabalho atualmente na Inspetoria Nossa Senhora Aparecida (BAP), das Filhas de Maria Auxiliadora?

Ir. Cleonice Aparecida Lourenço (Ir. Nice) – Hoje na Inspetoria eu estou responsável pela Animação Vocacional, pela Animação Missionária e, também, pela AJS, e uma coisa está ligada à outra. Se a gente for pensar em vocação, precisa pensar em como ajudar os meninos e as meninas a fazerem a experiência de Jesus Cristo, e isso está relacionado à realidade de ir para a missão, para o querigma, para o anúncio de Jesus Cristo. Depois, com a AJS, já é o protagonismo deles, dos jovens, que percebem a questão vocacional no caminho que estão trilhando. Acredito que é botando a mão na massa que cada um vai descobrindo o seu caminho na Igreja. E isso não só na vocação para ser religiosa ou para ser padre, mas na vocação em si, para o Reino de Deus.

 

Quando tratamos sobre vocação, muitas vezes pensamos só na vocação religiosa. Outras vezes, consideramos só a vocação profissional. O que é vocação nesse sentido mais amplo?

Ir. Nice – Vocação é muito mais do que profissão. A vocação está relacionada com o chamado – a palavra “vocare” significa chamado. Então cabe perguntar: Eu sou chamado a que? E, de maneira especial: Eu sou chamado a que no Reino de Deus? Esse questionamento vai me levar a escolhas que, como eu costumo dizer para a moçada, não são entre coisas ruins e outras boas, mas são escolhas que tenho que fazer entre várias opções boas. Para isso, preciso perceber qual é o meu chamado, o que Deus quer para a minha vida. Por exemplo: se eu sou chamado a ser médico, eu tenho essa profissão, mas que tipo de médico eu vou ser? O meu chamado é para a vida, para ajudar as pessoas a terem saúde e dignidade? Se tenho a minha profissão como professor, que tipo de educador eu vou ser? A vocação vai além daquilo que eu realizo financeiramente, ela envolve aquilo que me realiza como pessoa, acho que aí é que está o start da vocação.

Às vezes, nas escolhas que fazemos, nós – as juventudes e mesmo muitos adultos – vamos muito mais na linha da realização profissional ou financeira e esquecemos desse “detalhe” do que me realiza como pessoa. Escutamos profissionais que estão bem financeiramente, estão com sua casa e seu carro, e dizem que não são felizes. E é porque não responderam a essa vocação, que não foi trabalhada enquanto chamado de Deus para a construção de um mundo melhor. Lógico que a resposta primeira é a si mesmo. Mas, a partir do momento que eu estou bem, estou feliz, aquilo que está ao meu redor também passa a ter mais sentido. A vocação me leva a dar sentido para a minha própria vida, para a minha existência, para aquilo que eu faço, para a minha realização afetiva e emocional.

 

Existe uma missão da Família Salesiana em ajudar as juventudes na caminhada vocacional?

Ir. Nice – Acredito que sim e que é o cerne da Família Salesiana. Se olharmos a história de Dom Bosco e de Madre Mazzarello, vamos perceber que, dentro da realidade em que viviam, o que eles queriam é que os jovens tivessem um sentido para a vida. Em uma linguagem moderna, a gente fala em “projeto de vida”, mas é o que Dom Bosco e Madre Mazzarello propunham para as juventudes daquela época. Lógico que do jeito deles, vivendo o Sistema Preventivo na realidade de então. Hoje, cabe a cada pessoa da Família Salesiana viver esse Sistema Preventivo conforme a nossa realidade.

A Família Salesiana é chamada a fazer com que o jovem perceba primeiro o quanto é amado por Deus e, depois, o quanto esse amor não é intimista, mas é um amor que quer ser partilhado com outros. Mas eu sempre lembro, e isso para mim é muito forte, que eu só vou conseguir fazer isso se a minha vida também estiver centralizada em Jesus Cristo. Preciso saber do amor que Jesus Cristo tem por mim para conseguir que os jovens que estão ao meu lado também percebam esse grande amor. É isso que Dom Bosco e Mazzarello faziam: levar os jovens a se sentissem amados para que, a partir desse amor, conseguissem transpor montanhas e doar a vida em favor dos outros.

 

A senhora afirmou que não adianta falar de vocação sem demonstrar isso. O que traz maior alegria ou maior realização na sua vocação de FMA?

Ir. Nice – Hoje estou com 25 anos de profissão religiosa e fiz 51 anos de idade. Quando comecei, eu pensava em ser Irmã para poder ajudar os jovens. Mas é muito mais do que isso. Hoje percebo a presença de Deus na minha vida de uma forma muito mais madura, mais consciente, mais palpável até. O que me deixa feliz é quando consigo perceber que, como religiosa FMA, pude ajudar os jovens a perceberem o quanto são amados por Deus. É saber que aquele jovem que você escutou, que acolheu nesse caminho, consegue hoje dar passos muito concretos na vida; ele consegue ser no mundo luz e presença. Não é pelo que você fez, porque você foi apenas um instrumento, mas ele se sentiu acolhido por Deus através de você. Isso é o que me dá mais felicidade: perceber que o jovem conseguiu fazer o seu próprio caminho a partir de uma escuta sua.

 

Retomando o Ano Vocacional: como viver esse momento da Igreja na perspectiva salesiana?

Ir. Nice – Para nós, da Família Salesiana, penso que a importância da reflexão proposta pelo Ano Vocacional é justamente que nós sejamos pessoas que possam acolher as juventudes. Mas como elas são, não querendo mudá-las. Precisamos ter mais confiança nessas juventudes. Eu vejo que Dom Bosco e Madre Mazzarello, os dois, começaram a vida da congregação e do instituto simplesmente confiando nos jovens. O jovem é capaz de grandes mudanças, ele é super otimista e quer um mundo melhor. O jovem é solidário. No último mês (de julho), em todas as inspetorias FMA e SDB do Brasil aconteceram as semanas missionárias, e a gente percebe como os jovens se empenham para que isso aconteça, como eles se envolvem.

Mesmo que pensemos que isso é pouco diante da necessidade que temos no Brasil, precisamos olhar lá no passado: Jesus tinha poucos, era um grupo de apenas 12. Os primeiros cristãos eram poucos. Os primeiros salesianos e salesianas também eram poucos, mas foram contagiando as pessoas e hoje estão presentes em todo o mundo. Como cristãos, como salesianos e salesianas, como Família Salesiana, ao buscarmos a construção desse mundo melhor especialmente para as juventudes, precisamos acreditar nos jovens, isso é fundamental. A gente precisa ter a força e a coragem de escutá-los sem julgamentos e imposições.

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A missão de ajudar os jovens na descoberta da própria vocação

Domingo, 20 Agosto 2023 17:35 Escrito por 
O que é vocação? Por que é importante apoiar os jovens no discernimento vocacional? E qual é a missão da Família Salesiana no acompanhamento para que cada jovem descubra o caminho de felicidade que Deus traçou em sua vida? Essas são algumas das questões refletidas nesta entrevista com a irmã Cleonice Aparecida Lourenço (Ir. Nice).  

Irmã Cleonice Aparecida Lourenço, a Irmã Nice, tem 51 anos de idade e 25 como Filha de Maria Auxiliadora (FMA). Atualmente, ela é responsável, na Inspetoria Nossa Senhora Aparecida (BAP) pela Animação Vocacional, pela Animação Missionária e pela Articulação da Juventude Salesiana (AJS). Nesta entrevista ao Boletim Salesiano, Ir. Nice dá o seu testemunho sobre como esses três serviços estão interligados, sobre a necessidade de falar aos jovens a respeito da vocação como resposta a um chamado de Deus para a vida e sobre o que pensa da missão da Família Salesiana no acompanhamento vocacional das juventudes. Confira!

 

Qual é o seu trabalho atualmente na Inspetoria Nossa Senhora Aparecida (BAP), das Filhas de Maria Auxiliadora?

Ir. Cleonice Aparecida Lourenço (Ir. Nice) – Hoje na Inspetoria eu estou responsável pela Animação Vocacional, pela Animação Missionária e, também, pela AJS, e uma coisa está ligada à outra. Se a gente for pensar em vocação, precisa pensar em como ajudar os meninos e as meninas a fazerem a experiência de Jesus Cristo, e isso está relacionado à realidade de ir para a missão, para o querigma, para o anúncio de Jesus Cristo. Depois, com a AJS, já é o protagonismo deles, dos jovens, que percebem a questão vocacional no caminho que estão trilhando. Acredito que é botando a mão na massa que cada um vai descobrindo o seu caminho na Igreja. E isso não só na vocação para ser religiosa ou para ser padre, mas na vocação em si, para o Reino de Deus.

 

Quando tratamos sobre vocação, muitas vezes pensamos só na vocação religiosa. Outras vezes, consideramos só a vocação profissional. O que é vocação nesse sentido mais amplo?

Ir. Nice – Vocação é muito mais do que profissão. A vocação está relacionada com o chamado – a palavra “vocare” significa chamado. Então cabe perguntar: Eu sou chamado a que? E, de maneira especial: Eu sou chamado a que no Reino de Deus? Esse questionamento vai me levar a escolhas que, como eu costumo dizer para a moçada, não são entre coisas ruins e outras boas, mas são escolhas que tenho que fazer entre várias opções boas. Para isso, preciso perceber qual é o meu chamado, o que Deus quer para a minha vida. Por exemplo: se eu sou chamado a ser médico, eu tenho essa profissão, mas que tipo de médico eu vou ser? O meu chamado é para a vida, para ajudar as pessoas a terem saúde e dignidade? Se tenho a minha profissão como professor, que tipo de educador eu vou ser? A vocação vai além daquilo que eu realizo financeiramente, ela envolve aquilo que me realiza como pessoa, acho que aí é que está o start da vocação.

Às vezes, nas escolhas que fazemos, nós – as juventudes e mesmo muitos adultos – vamos muito mais na linha da realização profissional ou financeira e esquecemos desse “detalhe” do que me realiza como pessoa. Escutamos profissionais que estão bem financeiramente, estão com sua casa e seu carro, e dizem que não são felizes. E é porque não responderam a essa vocação, que não foi trabalhada enquanto chamado de Deus para a construção de um mundo melhor. Lógico que a resposta primeira é a si mesmo. Mas, a partir do momento que eu estou bem, estou feliz, aquilo que está ao meu redor também passa a ter mais sentido. A vocação me leva a dar sentido para a minha própria vida, para a minha existência, para aquilo que eu faço, para a minha realização afetiva e emocional.

 

Existe uma missão da Família Salesiana em ajudar as juventudes na caminhada vocacional?

Ir. Nice – Acredito que sim e que é o cerne da Família Salesiana. Se olharmos a história de Dom Bosco e de Madre Mazzarello, vamos perceber que, dentro da realidade em que viviam, o que eles queriam é que os jovens tivessem um sentido para a vida. Em uma linguagem moderna, a gente fala em “projeto de vida”, mas é o que Dom Bosco e Madre Mazzarello propunham para as juventudes daquela época. Lógico que do jeito deles, vivendo o Sistema Preventivo na realidade de então. Hoje, cabe a cada pessoa da Família Salesiana viver esse Sistema Preventivo conforme a nossa realidade.

A Família Salesiana é chamada a fazer com que o jovem perceba primeiro o quanto é amado por Deus e, depois, o quanto esse amor não é intimista, mas é um amor que quer ser partilhado com outros. Mas eu sempre lembro, e isso para mim é muito forte, que eu só vou conseguir fazer isso se a minha vida também estiver centralizada em Jesus Cristo. Preciso saber do amor que Jesus Cristo tem por mim para conseguir que os jovens que estão ao meu lado também percebam esse grande amor. É isso que Dom Bosco e Mazzarello faziam: levar os jovens a se sentissem amados para que, a partir desse amor, conseguissem transpor montanhas e doar a vida em favor dos outros.

 

A senhora afirmou que não adianta falar de vocação sem demonstrar isso. O que traz maior alegria ou maior realização na sua vocação de FMA?

Ir. Nice – Hoje estou com 25 anos de profissão religiosa e fiz 51 anos de idade. Quando comecei, eu pensava em ser Irmã para poder ajudar os jovens. Mas é muito mais do que isso. Hoje percebo a presença de Deus na minha vida de uma forma muito mais madura, mais consciente, mais palpável até. O que me deixa feliz é quando consigo perceber que, como religiosa FMA, pude ajudar os jovens a perceberem o quanto são amados por Deus. É saber que aquele jovem que você escutou, que acolheu nesse caminho, consegue hoje dar passos muito concretos na vida; ele consegue ser no mundo luz e presença. Não é pelo que você fez, porque você foi apenas um instrumento, mas ele se sentiu acolhido por Deus através de você. Isso é o que me dá mais felicidade: perceber que o jovem conseguiu fazer o seu próprio caminho a partir de uma escuta sua.

 

Retomando o Ano Vocacional: como viver esse momento da Igreja na perspectiva salesiana?

Ir. Nice – Para nós, da Família Salesiana, penso que a importância da reflexão proposta pelo Ano Vocacional é justamente que nós sejamos pessoas que possam acolher as juventudes. Mas como elas são, não querendo mudá-las. Precisamos ter mais confiança nessas juventudes. Eu vejo que Dom Bosco e Madre Mazzarello, os dois, começaram a vida da congregação e do instituto simplesmente confiando nos jovens. O jovem é capaz de grandes mudanças, ele é super otimista e quer um mundo melhor. O jovem é solidário. No último mês (de julho), em todas as inspetorias FMA e SDB do Brasil aconteceram as semanas missionárias, e a gente percebe como os jovens se empenham para que isso aconteça, como eles se envolvem.

Mesmo que pensemos que isso é pouco diante da necessidade que temos no Brasil, precisamos olhar lá no passado: Jesus tinha poucos, era um grupo de apenas 12. Os primeiros cristãos eram poucos. Os primeiros salesianos e salesianas também eram poucos, mas foram contagiando as pessoas e hoje estão presentes em todo o mundo. Como cristãos, como salesianos e salesianas, como Família Salesiana, ao buscarmos a construção desse mundo melhor especialmente para as juventudes, precisamos acreditar nos jovens, isso é fundamental. A gente precisa ter a força e a coragem de escutá-los sem julgamentos e imposições.

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