“As vitórias obtidas com a violência são falsas vitórias”

Sexta, 23 Fevereiro 2018 11:57 Escrito por  Iago Rodrigues Ervanovite
“As vitórias obtidas com a violência são falsas vitórias” iStock.com
Com essas palavras, o papa Francisco convidou todos, mas especialmente os católicos, para realizar, no dia 23 de fevereiro, um Dia Mundial de Jejum e Oração pela Paz.  

A proposta do Santo Padre com o Dia Mundial de Jejum e Oração pela Paz foi que pudéssemos oferecer nossas orações e sacrifícios a Deus, pela paz, em especial, das populações da República do Congo e do Sudão do Sul, ambos os países no continente africano. O Pontífice dirigiu um apelo também para que cada um de nós ouça este grito e que cada um, diante de Deus, pergunte na própria consciência: “O que eu posso fazer pela paz?”. É sobre isso que devemos nos questionar.

 

Paz

Segundo o dicionário Michaellis, “paz” significa “relação entre pessoas que não estão em conflito; acordo, concórdia”, ou, ainda, “relação tranquila entre cidadãos; ausência de problemas, de violência”. A palavra vem do latim “Pax” ou “Pacem”, derivada da contração “Absentia Belli” (ou seja, “ausência de guerra”). Porém, ela não é apenas a ausência de guerra entre os países, ou entre pessoas. A paz tem, hoje, um significado muito mais profundo.

Para nós, cristãos, a paz é um estado de tranquilidade e harmonia, seja em nosso interior, seja com Deus, seja com os outros. A paz é, pois, “anseio profundo de todos os homens de todos os tempos, não se pode estabelecer nem consolidar senão no pleno respeito da ordem instituída por Deus” (Pacem in Terris, 1).

Isso decorre dos mandamentos que nos foram ensinados por Jesus, quando questionado por um doutor da Lei: “Mestre, qual é o maior dos mandamentos?”, e Jesus lhe respondeu “Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o coração, com toda a tua alma, e com todo o teu entendimento. Este é o maior e o primeiro dos mandamentos. O segundo é semelhante: amarás teu próximo como a ti mesmo”. E afirma: “Toda a lei e os profetas dependem desses dois mandamentos”.

Nesse trecho, Jesus nos dá, em verdade, três mandamentos de amor: a Deus, a si próprio e ao próximo. É justamente na relação de tranquilidade e harmonia com estes “elementos” que identificamos nossa paz, como cristãos. E daí nasce a necessidade não apenas de um regrado relacionamento com o divino (cultivar nossa fé por meio da prática religiosa), mas, também, a necessidade de cultivar o autocuidado (da nossa própria saúde, física ou mental, da nossa autoestima, etc.) e um olhar atento ao irmão, principalmente o desamparado.

São João XXIII, em sua encíclica Pacem in Terris, nos lembra que é a ordem de convivência harmônica e justa entre os seres humanos que pode propiciar a paz em suas mais diferentes esferas, seja entre os cidadãos, seja entre as nações.

Naquela carta, o então Papa elencou uma série de direitos que devem ser assegurados a todos, como fundamento da dignidade da pessoa e, portanto, como garantidores da paz entre os homens. São os direitos: à existência e a um padrão de vida digno; a valores morais e culturais; de honrar a Deus segundo os ditames da reta consciência; à liberdade de escolha; ao trabalho; de reunião e associação; de emigração e imigração; políticos.

Ainda, o João XXIII nos elencou alguns deveres recíprocos, cuja observância também asseguraria a paz no convívio social. São os deveres de: colaboração mútua; responsabilidade sobre seus deveres; convivência fundada sobre a verdade, a justiça, o amor e a liberdade; observância de uma ordem moral, que tenha Deus como fundamento.

Parece-nos, à luz das Escrituras e do magistério da Igreja, que o exercício da paz está muito relacionado ao respeito entre os povos e entre as pessoas, coisa tão difícil de se observar hoje.

 

Entender o Evangelho

A paz é dever do cristão (cf. Mt 5,9), que é chamado a ser um pacificador em sua comunidade. Contudo, Jesus nos alerta: “Não penseis que vim trazer paz à Terra; não vim trazer paz, mas espada” (Mt 10,34). Se Cristo é o Príncipe da Paz (Is 9,6), por que nos fez esta declaração?

A resposta a esse questionamento é até simples: os valores do Reino exigem o abandono dos maus hábitos do mundo, dos pecados. Jesus, então, se refere à oposição que existe entre aqueles que aceitam as palavras do Evangelho e aqueles que o rejeitam; não se refere, pois, à guerra entre países ou pessoas. O Filho de Deus, que se fez carne e habitou entre nós, conclama-nos à Paz que o próprio Deus nos oferece, mas é ciente de que não será uma tarefa fácil a de espalhar e seguir Sua Palavra.

Seguir os mandamentos implica em renunciar à individualidade para que possamos nos preocupar com o irmão. Devemos dar o mesmo amor aos outros, principalmente aos mais excluídos, aqueles que não têm acesso digno aos direitos que acima relacionamos, quanto nos dedicamos e nos preocupamos com nós mesmos.

O que podemos fazer, então, concretamente, pela paz, tal como nos provocou o Papa Francisco? Estamos preparados para tudo o que isso nos exige?

 

Iago Rodrigues Ervanovite, 24 anos, é advogado, formado pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo, Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve) da Presidência da República, e ex-secretário nacional da Pastoral da Juventude Estudantil (PJE).

 

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Última modificação em Sexta, 23 Fevereiro 2018 12:12

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“As vitórias obtidas com a violência são falsas vitórias”

Sexta, 23 Fevereiro 2018 11:57 Escrito por  Iago Rodrigues Ervanovite
“As vitórias obtidas com a violência são falsas vitórias” iStock.com
Com essas palavras, o papa Francisco convidou todos, mas especialmente os católicos, para realizar, no dia 23 de fevereiro, um Dia Mundial de Jejum e Oração pela Paz.  

A proposta do Santo Padre com o Dia Mundial de Jejum e Oração pela Paz foi que pudéssemos oferecer nossas orações e sacrifícios a Deus, pela paz, em especial, das populações da República do Congo e do Sudão do Sul, ambos os países no continente africano. O Pontífice dirigiu um apelo também para que cada um de nós ouça este grito e que cada um, diante de Deus, pergunte na própria consciência: “O que eu posso fazer pela paz?”. É sobre isso que devemos nos questionar.

 

Paz

Segundo o dicionário Michaellis, “paz” significa “relação entre pessoas que não estão em conflito; acordo, concórdia”, ou, ainda, “relação tranquila entre cidadãos; ausência de problemas, de violência”. A palavra vem do latim “Pax” ou “Pacem”, derivada da contração “Absentia Belli” (ou seja, “ausência de guerra”). Porém, ela não é apenas a ausência de guerra entre os países, ou entre pessoas. A paz tem, hoje, um significado muito mais profundo.

Para nós, cristãos, a paz é um estado de tranquilidade e harmonia, seja em nosso interior, seja com Deus, seja com os outros. A paz é, pois, “anseio profundo de todos os homens de todos os tempos, não se pode estabelecer nem consolidar senão no pleno respeito da ordem instituída por Deus” (Pacem in Terris, 1).

Isso decorre dos mandamentos que nos foram ensinados por Jesus, quando questionado por um doutor da Lei: “Mestre, qual é o maior dos mandamentos?”, e Jesus lhe respondeu “Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o coração, com toda a tua alma, e com todo o teu entendimento. Este é o maior e o primeiro dos mandamentos. O segundo é semelhante: amarás teu próximo como a ti mesmo”. E afirma: “Toda a lei e os profetas dependem desses dois mandamentos”.

Nesse trecho, Jesus nos dá, em verdade, três mandamentos de amor: a Deus, a si próprio e ao próximo. É justamente na relação de tranquilidade e harmonia com estes “elementos” que identificamos nossa paz, como cristãos. E daí nasce a necessidade não apenas de um regrado relacionamento com o divino (cultivar nossa fé por meio da prática religiosa), mas, também, a necessidade de cultivar o autocuidado (da nossa própria saúde, física ou mental, da nossa autoestima, etc.) e um olhar atento ao irmão, principalmente o desamparado.

São João XXIII, em sua encíclica Pacem in Terris, nos lembra que é a ordem de convivência harmônica e justa entre os seres humanos que pode propiciar a paz em suas mais diferentes esferas, seja entre os cidadãos, seja entre as nações.

Naquela carta, o então Papa elencou uma série de direitos que devem ser assegurados a todos, como fundamento da dignidade da pessoa e, portanto, como garantidores da paz entre os homens. São os direitos: à existência e a um padrão de vida digno; a valores morais e culturais; de honrar a Deus segundo os ditames da reta consciência; à liberdade de escolha; ao trabalho; de reunião e associação; de emigração e imigração; políticos.

Ainda, o João XXIII nos elencou alguns deveres recíprocos, cuja observância também asseguraria a paz no convívio social. São os deveres de: colaboração mútua; responsabilidade sobre seus deveres; convivência fundada sobre a verdade, a justiça, o amor e a liberdade; observância de uma ordem moral, que tenha Deus como fundamento.

Parece-nos, à luz das Escrituras e do magistério da Igreja, que o exercício da paz está muito relacionado ao respeito entre os povos e entre as pessoas, coisa tão difícil de se observar hoje.

 

Entender o Evangelho

A paz é dever do cristão (cf. Mt 5,9), que é chamado a ser um pacificador em sua comunidade. Contudo, Jesus nos alerta: “Não penseis que vim trazer paz à Terra; não vim trazer paz, mas espada” (Mt 10,34). Se Cristo é o Príncipe da Paz (Is 9,6), por que nos fez esta declaração?

A resposta a esse questionamento é até simples: os valores do Reino exigem o abandono dos maus hábitos do mundo, dos pecados. Jesus, então, se refere à oposição que existe entre aqueles que aceitam as palavras do Evangelho e aqueles que o rejeitam; não se refere, pois, à guerra entre países ou pessoas. O Filho de Deus, que se fez carne e habitou entre nós, conclama-nos à Paz que o próprio Deus nos oferece, mas é ciente de que não será uma tarefa fácil a de espalhar e seguir Sua Palavra.

Seguir os mandamentos implica em renunciar à individualidade para que possamos nos preocupar com o irmão. Devemos dar o mesmo amor aos outros, principalmente aos mais excluídos, aqueles que não têm acesso digno aos direitos que acima relacionamos, quanto nos dedicamos e nos preocupamos com nós mesmos.

O que podemos fazer, então, concretamente, pela paz, tal como nos provocou o Papa Francisco? Estamos preparados para tudo o que isso nos exige?

 

Iago Rodrigues Ervanovite, 24 anos, é advogado, formado pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo, Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve) da Presidência da República, e ex-secretário nacional da Pastoral da Juventude Estudantil (PJE).

 

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