Muito antes da polêmica “do Sul”, quando o Mato Grosso era um só, os salesianos chegaram a uma região rica em florestas, minério, terras fartas e férteis e... índios em profusão. Qualquer bom historiador e jornalista não pode falar desses dois estados irmãos sem curvar-se ao trabalho e heroísmo de muitos salesianos que por aqui tornaram reais os sonhos de Dom Bosco.
Faço parte dessa história desde 1977, quando entrei no pré-aspirantado do Patronato Santo Antônio em Coxipó da Ponte, Cuiabá, MT. Desde essa época, convivo com os salesianos como pré-aspirante, aspirante, noviço, estudante de filosofia, professor e colaborador. Pude constatar na prática a santidade de muitos padres e irmãos consagrados que dedicam suas vidas ao “dai-me almas” de Dom Bosco.
Nas missões indígenas, não podemos esquecer o trabalho incansável dos irmãos Luiz e Franz, mestres Paulinho e Euclides, que construíram estradas, pontes e mini usinas de energia para os Bororo e Xavante, deixando marcas de heroísmo pontuado pelo sangue de missionários como o padre Rodolpho Lunkenbein.
O gosto pela música tão próprio dos salesianos foi plantado por mestres como padre Francisco Czapla e mestre Bombled da banda “furiosa” do Patronato, passando pelo padre Osmar Bezutte, mestre Fernando e pela Banda Symbolum, liderada em Campo Grande, na década de 90, pelo padre Gildásio Mendes, atual presidente da Missão Salesiana. Bandas de música, orquestras, corais e conjuntos musicais foram os responsáveis pela ainda hoje despontam no cenário musical brasileiro.
E o teatro? Esse sempre teve um espaço de destaque na Educação Salesiana. Ainda com dez anos comecei a interpretar clássicos dirigidos pelo mestre Bombled e depois mestre Altair, nas salas de espetáculos no Patronato, Lagoa da Cruz e Colégio Dom Bosco. Do mega espetáculo “Jesus Cristo Superstar”, passando pelo musical “Morte e Vida Severina” ou ainda pela comédia “Sete Moleques Num Quintal”, encantavam plateias e serviam para espantar o medo de encarar o público e desenvolver a oratória.
O gosto pelo esporte foi trazido pelos padres italianos, espanhóis e alemães que, a exemplo de Dom Bosco, arregaçavam a batina para correr com os alunos nos oratórios, escolas e aldeias indígenas. As escolas sempre foram grandes praças esportivas com crianças, adolescentes e jovens correndo atrás de uma bola. S. João Bosco já dizia: “é no pátio que conhecemos quem verdadeiramente são os nossos alunos”. Ginásios, campos de futebol e quadras poliesportivas foram plantados em todos os lugares e se tornaram celeiros de craques nas várias modalidades.
Escolas, faculdades e universidades construídas pelos Salesianos foram responsáveis pela formação de dezenas de milhares de jovens que consolidaram o sonho da fronteira de desenvolvimento do extremo oeste brasileiro e também no interior do Estado de São Paulo. Os ex-alunos salesianos sempre estiveram presentes na administração pública em todos os níveis e na iniciativa privada levando em frente o mote salesiano de “formar bons cristãos e honestos cidadãos”.
Na universidade os grandes mestres salesianos como padres Walter Bocchi – “Reizinho”, Félix Zavattaro – “papai” entre muitos ou ainda padres Marinoni e Martinez fizeram história e transformaram a desbravadora FUCMT na UCDB, uma das principais universidades da região.
Que maravilha escutar as histórias do mestre José Veronese - “Mata Onça”, ouvi-lo cantar nos boas-noites da Chácara São Vicente e sofrer e sarar com suas receitas milagrosas como o “santo alho”. O gosto pela Língua Portuguesa começou com o padre Leal e foi purificado pela leitura, estudos e verdadeiras batalhas literárias proporcionadas pelo padre Afonso de Castro com nossos mestres Fernando Pessoa, Camões – “As armas e os barões assinalados” e Machado de Assis, entre outros. Utilizando a paisagem deslumbrante da Lagoa da Cruz, gravamos dezenas de poesias dos grandes mestres da Língua Portuguesa ainda na década de 80: “vozes veladas, veludosas vozes”, “café com pão, café com pão, que é isso maquinista?”.
Com certeza São João Bosco, lá de cima, sorri de contentamento vendo as obras plantadas por seus filhos nesses 120 anos. A Missão Salesiana continuou unindo os dois estados que a política teimou em separar, trazendo junto todo o oeste de São Paulo, potencializando uma região que já não é mais um projeto, mas sim uma grande realidade no cenário nacional.
Lúdio da Silvaé formado em Filosofia e Jornalismo, com Mestrado em Educação. Trabalha no Colégio Salesiano Dom Bosco de Campo Grande, MS. Escreveu este artigo originalmente para o Boletim Informativo da Inspetoria Salesiana de Campo Grande (Ano 11 – n. 08 – março-junho de 2014).