Quem lê as cartas de São Francisco de Sales – e são muitíssimas as que restaram – percebe que ele, a todo momento, convida as pessoas que conduzia como diretor espiritual a viverem na alegria. Alguns exemplos: “Vivei alegre até quando puderes”; “Esteja sempre alegre”; “Não se entregue, absolutamente, à tristeza”; “Vivei em paz e na alegria, ou ao menos esteja contente”. Em que consiste essa alegria que ele prega? Escrevendo para a presidente Brülart, em 1605, Francisco de Sales afirma que “em Jesus de Nazaré, Deus se revelou o Deus da alegria”. Não é a alegria do mundo, passageira, que não nos enche de felicidade; mas a alegria cristã, a certeza de que Deus nos ama.
Isso não significa prescindir das alegrias humanas. No seu tempo se discutia se um religioso ou uma religiosa poderiam rir. Em um sermão da Quarta-feira de Cinzas de 1612, ele afirmou: “Oh! Estes pregadores! Vos proíbem toda alegria, todo alimento, todo sorriso, todo cuidado com os bens temporais; querem que vocês estejam o dia todo na igreja, sempre em jejum. Ah! Traidores da humanidade! Nós não dizemos isso, mas: nutri-vos de toda alegria, menos da alegria do pecado”.
Essa alegria cristã se manifesta no viver cotidiano, em aceitar os acontecimentos como sinal da vontade de Deus, como confiança no positivo, como sentido profundo do bem e da convicção de que ele é mais forte do que o mal. Nem sempre, porém, conseguimos viver alegres. Vivemos tempos marcados por muita ansiedade, depressão e angústias. Escrevendo à Senhora de Granieu, Sales afirma que não compreende, realmente, “como as almas que se deram à divina Bondade não estejam sempre alegres, porque pode haver felicidade maior do que essa?”.
Em tudo a vontade de Deus
Essa alegria se torna ainda maior quando procuramos fazer a vontade de Deus, pois Ele quer a nossa santidade! Ele nos escolheu, nos dá seus dons e, principalmente, porque fomos santificados em Cristo, que disse: “Sede perfeitos como vosso Pai celeste”.
Sales afirma que isso, concretamente, se configura e se realiza num estado de vida, num trabalho, num lugar, numa rede de relacionamentos, direitos e deveres que nascem e mudam, na observância dos mandamentos, na luta contra o pecado e em acolher as boas inspirações e os acontecimentos que sobrevêm. Ele afirma que “é preciso florescer onde Deus nos plantou”! E para responder aos apelos da vontade de Deus, só dispomos do momento presente, do aqui e agora.
Sabemos como é difícil nos concentrarmos no presente. Muitas vezes, ficamos lamentando atos do passado ou nos atormentamos sobre o futuro incerto. Tudo isso pode nos distrair das oportunidades do presente. Escrevendo à Priora de Chartres, Francisco disse para ela que Jesus não nos manda pedir o pão anual, nem mensal e nem semanal, mas o de cada dia. Que ela faça tudo bem somente hoje, sem pensar no dia seguinte; e no dia seguinte, que faça o mesmo... “pois seu Pai celestial que cuida de você hoje, cuidará de você amanhã e no dia seguinte”. Então é necessário confiar na Providência de Deus. Ou Deus nos protegerá dos contratempos e nos libertará deles, ou nos dará forças para suportá-los. Encontrei um texto maravilhoso para entendermos isso: “Meu passado não me preocupa mais, ele pertence à misericórdia de Deus. Meu futuro ainda não me preocupa, pois ele pertence à Providência de Deus. O que me preocupa é o hoje. Mas isso pertence à graça de Deus e à entrega da minha vontade”.
Na vida do dia a dia temos deveres, e cada dia devemos renovar e confirmar a nossa vontade de servir a Deus inteiramente, sem reservas. Para isso, Francisco aconselha a praticar as “pequenas virtudes”, ou “virtudes do coração”, como ele as chama. Em que consistem? Dar um bom dia com alegria, fazer um pequeno favor quando pudermos, fazer as tarefas caseiras sem reclamar e assim por diante. Na Filoteia ele diz: “Deixemos de bom grado essas virtudes extraordinárias às almas grandes e muito superiores a nós; não merecemos um lugar tão alto no serviço de Deus; seremos mais felizes se o servirmos em sua cozinha, em sua padaria, sendo criados e empregados de serviço; se a ele lhe parecer bem, nos chamará mais para frente em seu gabinete particular”.
Estar sempre alegres!
Dom Bosco soube sintetizar e atualizar a doutrina salesiana sobre o chamado à santidade quando, ao fazer uma pregação para os seus jovens, “desenvolveu três pontos que causaram profunda impressão no espírito de Domingos, a saber: é vontade de Deus que todos nos santifiquemos; é muito fácil conseguir este intento; terá um grande prêmio no céu quem conseguir tornar-se santo”. Essa pregação, diz Dom Bosco, “foi como que uma centelha que abrasou o seu coração no amor de Deus”.
Domingos aprendeu a lição. Conversando com um amigo que entrou no Oratório, Camilo Gávio, Domingos disse a célebre frase que marca a espiritualidade salesiana: “Sabe que nós aqui fazemos consistir a santidade em estar muito alegres. Procuramos apenas evitar o pecado, como grande inimigo que nos rouba a graça de Deus e a paz do coração, cumprir exatamente os nossos deveres e frequentar as práticas de piedade. Começa desde já a tomar nota da frase: sirvamos o Senhor em santa alegria”.