Além da Serra Leoa, o ebola se espalhou também por outros países da África, especialmente a República da Guiné, onde a epidemia teve início, e a Libéria. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a epidemia já causou 4.960 mortes em oito países, de um total de 13.268 casos registrados até 4 de novembro. Metade dos casos comprovados da doença ocorreu na Libéria, que já contabiliza 2.766 mortos. Em Serra Leoa, a OMS aponta 1.130 mortos entre 4.862 casos. E na Guiné, o terceiro país mais atingido, o percentual de vítimas fatais é impressionante: foram registrados 1.760 casos e 1.054 mortos.
Às mortes causadas diretamente pelo ebola somam-se outros problemas. As populações sofrem com a falta de informação nos locais mais longínquos, com o socorro precário às vítimas e com a falta de solidariedade – já que as pessoas estão apavoradas com o possível contágio. Tornou-se muito difícil o acesso à saúde para o cuidado de outras doenças e as aulas foram suspensas. Aumentou o número de órfãos e também o de crianças abandonadas. Há uma desestruturação social e econômica ainda maior em países que já figuravam entre os mais pobres do mundo. É nesse ambiente de medo, insegurança e desespero que os salesianos têm se esforçado em oferecer ajuda prática e espiritual.
Testemunho
Na República da Guiné estão presentes, entre outros, três salesianos espanhóis: José Ramón Guinea, em Kankan; Rafael Sabé, em Siguiri; e Emilio Hernando, na Capital, Conacri. Eles fazem parte dos Grupos de Prevenção ao Ebola locais e também se ocupam de mais de 300 crianças que ficaram órfãs por causa do vírus. “O hospital onde se encontram os pacientes está lotado”, informou à InfoANS o padre Hernando, que está na África há mais de 30 anos. “E por que continuo ainda aqui? Pela simples razão de que não podemos abandonar a população”, completa.
O padre Rafael Sabé, missionário desde 1992, concedeu uma entrevista emocionante à Agência Zenit, em que descreve como atuam os Grupos de Prevenção. “São grupos formados pelas forças vivas de um território: autoridades locais (prefeitos, deputados), autoridades sanitárias (médicos, enfermeiros), representantes da polícia e das empresas, autoridades religiosas – como o imã para os muçulmanos e o sacerdote para os cristãos. Neste sentido eu sou um representante cristão na região de Siguiri. Este grupo acompanha, diretamente, a evolução do ebola na região. Fazemos reuniões periódicas para refletir, conjuntamente, sobre as medidas a serem tomadas”, declarou ele.
De acordo com o salesiano, para combater o ebola é preciso isolar totalmente os doentes e, em caso de morte, sepultar imediatamente o corpo para evitar o contágio. O problema é que essa prática é contrária aos costumes locais. “Na tradição africana, a morte é um dos momentos mais importantes na vida: é preciso honrar os próprios mortos. Sei de uma família que nas cerimônias fúnebres perdeu nove membros por causa do ebola; e muitos ficaram contaminados, embora tenham sobrevivido. Eis porque é tão importante o trabalho de sensibilização feito pelo Grupo de Prevenção”, completa padre Sabé.
Informação
“Agora estamos na fase de informação sobre como comportar-se em caso de contágio; e de distribuição de material higiênico para a prevenção. Começamos também a distribuir alimentos aos que estão em isolamento e aos que mais precisam (idosos sós, famílias numerosas, mães solteiras)”. Com estas palavras o padre Nicola Ciarapica, diretor da Obra Dom Bosco Youth Centre, em Monróvia, capital da Libéria, conta o esforço dos salesianos para combater o ebola.
No país mais atingido pelo vírus, a ação da Igreja e de ONGs nacionais e internacionais é intenso, mas muitas vezes insuficiente para atender todas as necessidades. Um dos grandes problemas é que faltam médicos, enfermeiros e pessoal orientado para os serviços de limpeza, comida, coleta e sepultamento ou incineração dos mortos.
Padre Ciarapica demonstra uma grande preocupação também com o futuro. “Com o passar do tempo aparecerão problemas econômicos cada vez maiores para as famílias que precisam de remédios e de comida: estamos pensando em como ajudar essas famílias a se tornarem independentes, por meio de projetos que lhes permitam produzir alimentos. Estamos também pensando em como ajudar os alunos que não podem frequentar a escola (que será fechada pelo menos até janeiro ou a Páscoa 2015)”, reflete o salesiano.
Juventude
Se a Libéria é o país com maior número de casos do ebola, é também o local em que a força da solidariedade se faz sentir mais intensa. E essa força vem, sobretudo, da juventude. Nas duas presenças salesianas da capital, Monróvia (Obra Dom Bosco da 8ª Rua e de Nova Matadi), grupos de jovens se organizaram para levar educação e conhecimento a todos, sob o lema “Each One Reach One” (cada qual chegue a uma pessoa). Inicialmente, eles participaram de uma formação ministrada por agentes de saúde, médicos do Ministério da Saúde e da Previdência Social e Equipe de Formação do projeto de Resposta ao Ebola, promovido pela Igreja Católica.
Depois, os 105 jovens iniciaram as visitas às comunidades, para instruir as pessoas sobre como evitar a infecção e proteger-se do ebola. “Deste modo os jovens assumiram um papel de guias e desbravadores na luta contra o medo e a ignorância, para comunicar esperança e atitude positiva”, afirma o padre salesiano Sony Pottenplackal.
Dom Bosco
Um dos grandes exemplos dessa força juvenil é o Grupo Dom Bosco e Domingos Sávio, composto por jovens cristãos e muçulmanos. Formado pela iniciativa de um ex-aluno salesiano da Nigéria, o grupo inspirou-se na atitude de Dom Bosco e de seus alunos mais velhos que, durante a epidemia do cólera no final do século XIX, foram às periferias de Turim, na Itália, para levar auxílio e solidariedade às vítimas. Desde o início da epidemia do ebola na África, o ex-aluno Josephat e seus amigos percorrem as zonas rurais da Libéria, onde os informes e os agentes de saúde governamentais não chegam, para levar informação, assistência e produtos de higiene.
Em sua ação, o grupo enfrenta vários problemas além do risco da contaminação. Em muitos locais do interior da Libéria, as pessoas ainda não estão convencidas de que exista uma epidemia de ebola. Em outros, acreditam que os agentes de saúde sejam responsáveis pelo envenenamento da água dos poços. Em Gwaa, no distrito de Bomi, os rapazes do grupo foram parados pela polícia local e mantidos sob custódia. As autoridades só se convenceram de suas boas intenções depois que usaram em si mesmos os materiais que haviam trazido para distribuição nas casas. “Fizemo-lo lavando as mãos e o rosto com aquele material sanitário, seguindo-se um sincero, prolongado e público pedido de desculpas...”, conta Josephat.
As dificuldades, entretanto, não esmorecem o ânimo dos jovens: “Conseguimos visitar numerosas famílias nesta nossa missão e Deus está realmente fazendo coisas grandes. Alguns dos que atendemos receberam alta do hospital poucos dias atrás, curados do ebola porque seguiram os conselhos que havíamos dado em nossas visitas, de casa em casa”, completa Josephat, com esperança.
Fontes: padre Nicola Ciarapica, padre Sony Pottenplackal – InfoANS; Zenit; Misiones Salesianas - Espanha