Em todo o mundo, e também no Brasil, são dezenas – talvez centenas – as escolas e obras sociais mantidas pelas Filhas de Maria Auxiliadora (FMA) que levam o nome da Beata Laura Vicuña. Este é apenas um sinal de como a breve história de vida dessa menina latino-americana, que nasceu no Chile e viveu somente até os 13 anos na Argentina, é fonte de inspiração para o trabalho realizado pelas FMA em muitos aspectos, dos quais vamos destacar a proteção a meninas e mulheres vítimas da violência doméstica.
Biografia
Laura Carmen Vicuña nasceu em Santiago do Chile, no dia 5 de abril de 1891, filha primogênita de José Domingos e Mercedes Pino. Quando José Domingos morreu, Mercedes viu-se obrigada a ir para a Argentina com as duas filhas, indo para Junín de los Andes. Ali Mercedes conheceu o prepotente Manuel Mora e aceitou transferir-se para sua fazenda a fim de trabalhar, mas também para conviver com ele. Em troca o latifundiário, Manuel Mora prometeu pagar os estudos de Laura e de sua irmã Júlia.
Em 1900 elas foram aceitas no colégio das Filhas de Maria Auxiliadora. Laura demonstrou-se uma aluna modelo: empenhada na oração, atenta às orientações das Irmãs, disponível com as companheiras, sempre alegre e pronta a qualquer sacrifício. No ano seguinte, fez a primeira comunhão com o mesmo fervor e os mesmos propósitos de São Domingos Sávio, que tomara como modelo. Entrou na associação das Filhas de Maria.
Quando compreendeu a situação em que vivia Mercedes, subjugada pela violência e agressividade de Manuel Mora, Laura aumentou suas orações e sacrifícios pela conversão da mãe. Nas férias de 1902, Manuel Mora insidiou a pureza de Laura; ela recusou com firmeza, e ele a espancou.
Pedido atendido
Após mais um período no colégio, onde era auxiliar porque Mora não pagava mais a mensalidade, Laura voltou para casa e foi novamente agredida por Manuel, por recusar-se a ele. Consumida pelos sacrifícios e pela doença, causada pelas agressões que sofrera, confiou a Mercedes na última noite: “Mamãe, eu vou morrer! Há algum tempo eu pedi isso a Jesus, oferecendo-lhe a vida por ti, a fim de obter o teu retorno a Deus... Mamãe, será que terei antes de morrer a alegria de te ver arrependida?".
“Laura – respondeu Mercedes – juro-te que farei o que me pedes”. Laura morreu na noite de 22 de janeiro de 1904. Seus restos mortais estão na capela das Filhas de Maria Auxiliadora de Bahía Blanca, na Argentina. No centenário da morte de Dom Bosco, foi beatificada por João Paulo II, no dia 3 de setembro de 1988.
Violência doméstica
Laura Vicuña é a padroeira das vítimas de maus tratos e de violência doméstica, uma questão de direitos humanos cada vez mais preocupante no Brasil. Para citar apenas alguns dados recentes, o Atlas da Violência aponta que, em 2022, a violência doméstica representou 65,2% das notificações de violência contra mulheres, totalizando 144.285 casos. Já a Rede de Observatórios da Segurança, que monitora oito estados brasileiros, mostra que, no ano de 2023, ao menos oito mulheres foram vítimas de violência doméstica a cada 24 horas.
Quando se trata da violência contra menores, a situação é ainda mais grave. Segundo estudo feito pelo Núcleo de Ciências pela Infância (NCPI) sobre dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, o Brasil regista 673 casos de violência contra crianças de até 6 anos por dia, e 84% dessas agressões têm pais, padrastos, madrastas ou avós como suspeitos. Ainda segundo o estudo, crianças até 13 anos representam a maior parte das vítimas de estupro no Brasil (61,3% do total de casos).
Defesa das crianças e mulheres
A violência doméstica, ou intrafamiliar, é um dos focos de atuação da Família Salesiana, especialmente das Irmãs FMA. Com ações que vão desde atividades de conscientização sobre o problema e projetos para o empoderamento das mulheres, até o acolhimento de crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica, as diversas obras salesianas voltadas para crianças e adolescentes em situação de risco social e suas famílias se inspiram em Laura Vicuña e contribuem para combater esse grave problema social.
Como afirma a irmã Luzinete Rego Freitas, no artigo “Laura Vicuña e a violência intrafamiliar”, escrito para o Boletim Salesiano, engana-se quem vê na figura de Laura Vicuña apenas uma jovem frágil: “É necessário adentrar mais acuradamente em sua história pessoal e perceber, na trajetória de uma vida, eminentemente, curta, sua fortaleza e resistência diante da violência doméstica. [...] Neste contexto de horror ao pecado, e com clara consciência de que a violência e o abuso sexuais sofridos por sua mãe eram contrários à ética e ao respeito à sua dignidade de pessoa e de mulher, Laura, apenas uma adolescente, teve coragem suficiente de ir à luta e combater, de forma pacífica, a exploração sexual, uma das tantas formas de violência contra a mulher que perduram até os nossos dias do século XXI, não hesitando em oferecer sua própria vida em favor da libertação de sua mãe”.
Para saber mais
Oração pela canonização da Beata Laura Vicuña
Ó bem-aventurada Laura Vicuña,
tu que viveste até ao heroísmo
a tua configuração a Cristo,
acolhe nossa confiante oração.
Alcança-nos as graças
de que necessitamos...
e ajuda-nos a aderir
com coração puro e dócil
à vontade do Pai.
Obtém às nossas famílias, paz e fidelidade.
Faze com que, também em nossa vida,
como na tua, resplandeçam
fé coerente,
pureza corajosa,
caridade atenta e solícita
pelo bem dos irmãos.
Amém.