Começamos o ano novo com confiança e esperança, apesar de estarmos vivendo uma situação mundial incerta e precária. A celebração do bicentenário do sonho que Dom Bosco teve aos 9 anos de idade, em 1824, é para toda a Família Salesiana motivo de renovação carismática. O sonho que faz sonhar evoca, em nossa vida e em nosso coração, a dimensão salesiana da vocação e a necessidade de retornar, com a mente e o coração, à escolha pastoral missionária de Dom Bosco, que orientou a sua obra desde as suas origens humildes em Valdocco até à plena expansão no mundo.
É um sonho que continua a nos fazer sonhar, mas pede que sejamos conscientes da beleza da missão à qual somos chamados, hoje mais do que nunca, e que tenhamos a coragem de seguir em frente.
O Papa Francisco, nas saudações à Cúria romana (21/12/2023), afirma que é preciso ter coragem para amar e caminhar; para ir além. O trabalho, hoje, é o de transmitir paixão a quem a perdeu já faz tempo. Declara o Papa que a verdadeira diferença, na Igreja, não está entre conservadores e progressistas, mas entre “apaixonados” e “acomodados”.
O sonho só pode continuar se estamos apaixonados de verdade, se somos capazes de viver a mesma extraordinária paixão educativa de Dom Bosco e de Madre Mazzarello, se acreditamos que o Senhor pode fazer grandes obras em cada um de nós e através de nós!
A prioridade da nossa missão foi, e continua sendo, a de orientar as jovens e os jovens ao encontro do Senhor Jesus. Eles nos pedem para assumir novos estilos e novas estratégias para uma Pastoral mais aberta e sinodal (cf Ato do Capítulo Geral XXIV do Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora, n. 22) para que eles mesmos se tornem protagonistas e realizadores de propostas educativas no estilo do Evangelho e da espiritualidade salesiana.
Nós guardamos, como herança preciosa, o sonho de Joãozinho com o seu valor simbólico e carismático. Pensamos sobre a centralidade da figura de Maria, que o homem misterioso identifica como a “Mestra”. Maria está presente desde o início, no nascimento do carisma salesiano, justamente porque a sua missão é a de gerar vida. Por isso, o Senhor confiou a Ela o precioso compromisso de ser a Mestra (cf Estreia 2024, O sonho que faz sonhar, 1.4). É Ela quem acompanha Dom Bosco em várias etapas da vida, na realização do sonho e em dar-lhe continuidade no tempo.
Dois séculos depois, constatamos quanto bem foi realizado pela felicidade das jovens e dos jovens do mundo, além da atualidade da profecia feita a Joãozinho: “Eis o seu campo, onde deve trabalhar. Torne-se humilde, forte, robusto; e o que você vê nesse momento acontecer com esses animais, você deverá fazer pelos meus filhos”. É uma profecia que nos ajuda a ler a realidade atual e a repensar a nossa presença entre e com as jovens e os jovens, nos vários contextos do mundo.
No mês de fevereiro passado, participei das celebrações pelo encerramento do Centenário da chegada das primeiras Filhas de Maria Auxiliadora em São Gabriel da Cachoeira, na Inspetoria brasileira de Manaus “Nossa Senhora da Amazônia”. Essa Inspetoria missionária congrega comunidades, obras educativas e sociais nos estados do Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima.
Dentre essas, existem sete comunidades que operam cotidianamente, com generosidade e amor, entre os povos indígenas na área do Rio Negro. O único meio de transporte para alcançá-las é por barco, ou melhor, a “voadeira” que, às vezes, demora vários dias para chegar ao seu destino. É uma vida sacrificada, verdadeiramente missionária, um desafio cotidiano que se enfrenta num contexto natural belo e majestoso como a floresta amazônica, na absoluta sobriedade e na procura pelo essencial.
Ali as Filhas de Maria Auxiliadora e os Salesianos significam tudo: casa, escola, paróquia, oratório, assistência médica.
Nesse ambiente florescem as vocações indígenas, frutos da doação incansável de vida das missionárias que, ao chegarem ao Rio Negro, há cem anos, foram acolhidas com afeto e respeito pelas populações locais. Em conjunto com as pessoas dali, construíram escolas, internatos, hospitais, obras sociais e itinerantes para reunir as aldeias mais distantes na floresta. Um sonho que se tornou realidade nos cem anos de história, onde a graça de Deus, como chuva abundante, deixou fecundas no tempo a vida e a missão das primeiras Filhas de Maria Auxiliadora que deram ao carisma salesiano raízes profundas. Raízes que ainda hoje transmitem vida abundante.
Acolhendo a Profissão Perpétua de Irmã Aldiana Cordeiro Moreira, acompanhada pela sua família e pela dança dos indígenas de diferentes comunidades próximas a São Gabriel da Cachoeira, não pude deixar de me comover. Pensei que assim o sonho continua!
Que Maria, Mãe, Mestra e Guia, nos ajude a ter coragem e audácia; e ilumine o nosso presente e o nosso futuro, para que, então, o sonho possa continuar e seja fecundo de bem para as novas gerações.