Padre Ángel Fernandez Artime, Reitor-mor dos salesianos, visitou no mês de abril a Inspetoria Salesiana de Campo Grande, que está completando 125 anos de fundação. É ele quem ressalta a identidade missionária desta inspetoria, em uma das mensagens pronunciadas na aldeia indígena de Meruri, MT: “Meus queridos, este é um momento muito valioso, porque nós acreditamos que a dimensão missionária do nosso carisma nesta inspetoria de Mato Grosso é muito importante. Nós acreditamos que a nossa vida como salesianos, também como Família Salesiana, acompanha esses povos, os bororo e xavante, que hoje estiveram juntos, pela primeira vez e num momento histórico, unidos na oração, na celebração e na memória dos nossos servos de Deus”, disse ele, a poucos metros do lugar onde foram martirizados Simão Bororo e o padre Rodolfo Lunkenbein.
Um pouco de história
Cinco jovens missionários italianos desembarcam no porto de Cuiabá, MT, em 18 de junho de 1894. À frente do grupo estava dom Luís Lasagna. Após um mês instalados, os salesianos abriram o curso primário no presbitério da Paróquia São Gonçalo e, algumas semanas depois, o curso ginasial. Os oratórios festivos, missas cantadas, celebrações de primeira-comunhão e novenas de Natal dirigidas pelos salesianos encantaram rapidamente a população cuiabana, que também conquistou a simpatia dos missionários.
A região das missões de Meruri foi o primeiro ponto de encontro dos salesianos com os indígenas de Mato Grosso. Foi lá que trabalhou por 56 anos o padre Gonzalo Ochoa Camargo, nascido na Colômbia, hoje com 89 anos de idade e 60 de sacerdócio. “Os bororo são um povo maravilhoso que tem uma história muito sofrida. Sua organização social, sua relação com o mundo espiritual e com a natureza têm dado tema para muitos trabalhos científicos e artísticos. Pessoalmente, no contato com os anciãos bororo aprendi a praticar melhor o Evangelho”, afirma o missionário.
Também é missionário o padre Bartolomeo Giaccaria, diretor da Casa Filipi Rinaldi, em Nova Xavantina, MT. Nascido na região do Piemonte, na Itália, desde pequeno ouvia falar de Dom Bosco e já alimentava o desejo de ser missionário, por causa das histórias que lia no Boletim Salesiano. Algo que se concretizou no centro-oeste brasileiro. “Aprendi mais teologia olhando para os campos de cerrado e convivendo com as pessoas simples e com os indígenas do que estudando nos livros; troquei totalmente o meu modo de falar e pensar a partir do contato que tive com os xavante. Cheguei aqui pensando que ia converter os índios e as outras pessoas, mas vi que primeiro tenho que converter a mim mesmo”, revela.
Pedagogia Salesiana
A força da presença salesiana na região central do Brasil fica evidente nas escolas e universidades. Em Cuiabá, Campo Grande, Lins e Araçatuba, os colégios salesianos se confundem com a história das cidades que cresceram ao seu redor. Em Corumbá e Três Lagoas, MS, e Rondonópolis, Cáceres e Primavera do Leste, MT, os salesianos chegaram quando a estrutura urbana já estava pronta, o que não diminui a importância do trabalho educativo junto aos jovens.
No ambiente escolar cresce o movimento juvenil salesiano, partindo da proposta educativa e pastoral para grupos e celebrações de alunos, nos moldes consolidados na Articulação da Juventude Salesiana (AJS). O ambiente educativo, o exemplo dos salesianos padres e irmãos e o apoio dos leigos integrados nas atividades pastorais criam as condições favoráveis para o surgimento das vocações sacerdotais e religiosas que permitem a continuidade do carisma de Dom Bosco.
A Universidade Católica Dom Bosco - UCDB, hoje imponente, começou pequena em 1961 como Faculdade Dom Aquino de Filosofia Ciências e Letras, ainda no espaço do Colégio Dom Bosco. “O professor, dentro de uma casa salesiana, precisa ser diferenciado. Ele precisa ser não apenas um instrumento para passar conteúdo, mas também uma referência na vida desses jovens”, considera o padre Ricardo Carlos, reitor da UCDB. A UCDB, o Unisalesiano e a Faculdade Santa Teresa fazem parte das IUS (Instituições de Ensino Superior) da Congregação Salesiana.
Os leigos
O trabalho com os leigos foi utilizado por Dom Bosco nas suas primeiras iniciativas educativo-pastorais, que deram origem ao Oratório. Essa também foi a forma adotada pelos salesianos que chegaram ao antigo Estado de Mato Grosso e oeste de São Paulo. Hoje, nas paróquias salesianas, os leigos e especialmente os jovens são protagonistas em todas as atividades. “Jovens estão como ministros extraordinários da Eucaristia, jovens atuam na acolhida. Cada pastoral sabe que tem o papel fundamental de ter jovens fazendo parte desse movimento”, revela o padre Aldir da Silva, pároco da Paróquia São João Bosco, em Campo Grande, MS.
Para manter e aprofundar a participação dos leigos nas obras salesianas foi criado na Inspetoria o Plano Personalizado de Formação Continuada dos Leigos, que disponibiliza conteúdos para a preparação de colaboradores e voluntários das obras nas diferentes frentes de atuação dentro da Igreja e no carisma salesiano.
Com a proposta de viver uma experiência do Evangelho da Alegria, percorrendo os passos de Jesus Cristo, com Nossa Senhora e com Dom Bosco, foi criado o projeto da “Rota Juvenil Salesiana”. O cenário é o caminho que os salesianos desbravaram e plantaram as raízes do cristianismo nos sertões mato-grossenses. A ideia tem despertado o interesse de jovens, não só do território abrangido pela Missão Salesiana de Mato Grosso, mas também de outros Estados brasileiros e de fora do país.
Em favor dos jovens
Dom Bosco começou os oratórios festivos para atender os jovens pobres de Turim, abandonados pelas famílias, sem instrução, sem religião, sem perspectiva de vida. Mais de um século se passou e essa realidade continua presente em cidades onde a ação salesiana ainda se mostra fundamental. É o caso de Corumbá, MS, que fica na fronteira do Brasil com a Bolívia e está em uma das principais rotas do tráfico internacional de drogas. Prostituição, violência e falta de opções de futuro fazem parte do cotidiano da juventude.
Nesse contexto, os salesianos estão presentes em três obras sociais. O padre Eduardo de Moura, encarregado do Setor de Obras Sociais, Oratórios e Centros Juvenis da Inspetoria, é o diretor de uma delas, a Cidade Dom Bosco. Uma presença de mais de 50 anos que promove o resgate da juventude corumbaense, oferecendo alimento físico e espiritual aos atendidos. “Eles estão ali não como uma opção a mais, mas por falta de opção e a missão dos salesianos nessa realidade é preencher os espaços em todas as dimensões, inclusive do afeto, porque a maioria das famílias é desestruturada, bastante machucada”, afirma. Em Corumbá, boa parte da população tem alguma ligação física ou afetiva com o trabalho dos salesianos, especialmente do padre Ernesto Saksida, que foi o fundador da Cidade Dom Bosco.
Grande parte do trabalho de instalação e fortalecimento das bases na MSMT foi feita por salesianos missionários vindos principalmente da Europa. Mas hoje existe uma geração de salesianos oriundos de um longo e participativo trabalho vocacional. Este trabalho é realizado pelo Setor de Acompanhamento Vocacional, coordenado pelo padre Wagner Galvão. “A nossa esperança e o nosso desejo é dar oportunidade para que os jovens façam o discernimento vocacional”, relata ele. Neste ano, cerca de 30 aspirantes à vida religiosa são acompanhados no processo formativo, que inclui convivência, estudos, pastoral e direção espiritual.
Árvore frutífera
Com 125 anos de presença nos Estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e oeste de São Paulo, os salesianos deixam marcas visíveis nos lugares onde vivem e trabalham. “São muitos os frutos que temos colhido diariamente na nossa Inspetoria. Por exemplo, o fruto de santidade de todos os salesianos que, no silêncio do trabalho, vivem essa santidade do serviço e do amor aos outros, do grande amor a Dom Bosco, da vivência do carisma salesiano no meio dos destinatários, a forte devoção a Nossa Senhora Auxiliadora, a fidelidade à Igreja e à Congregação”, afirma o inspetor da MSMT, padre Gildásio Mendes dos Santos.
Essa santidade tem seu exemplo mais marcante em Simão Bororo e padre Rodolfo Lunkenbein. O inspetor retoma a história dos mártires de Meruri por considerar que um salesiano e um indígena que compartilharam o momento da entrega total da vida em nome da fé e em benefício de um povo são o testemunho claro da força do carisma de Dom Bosco. “O carisma salesiano é dom de Deus para a Igreja. É dom do Espírito Santo para os jovens. Por isso, o carisma tem uma força e um significado muito grandes. O carisma de educar os jovens, sobretudo os mais pobres e necessitados, dá vida e vitalidade à missão evangelizadora, educativa e pastoral salesiana. O carisma é vivo, presente, sempre atual”, finaliza.