Missões: Salesianos na Amazônia

Quarta, 28 Outubro 2020 00:41 Escrito por 
Desde 1915, a missão salesiana se desenvolve junto a 23 etnias indígenas na região do Rio Negro e seus afluentes, no extremo norte do país.    

A dimensão missionária salesiana no Brasil tem expressão especialmente na presença entre os povos indígenas. As inspetorias São Domingos Sávio e Missão Salesiana do Mato Grosso, dos Salesianos de Dom Bosco, e Laura Vicunha, Santa Teresinha e Nossa Senhora da Paz, das Filhas de Maria Auxiliadora, são consideradas como missionárias justamente por isso.

 

“O conceito missionário hoje vai além, no sentido de que a missão não tem fronteiras. Mas essas inspetorias são consideradas como missionárias pelo fato de ter um trabalho bem específico com os povos indígenas”, explica o padre Reginaldo Cordeiro, SDB, vice-inspetor e delegado de Animação Missionária da Inspetoria São Domingos Sávio. “A nossa inspetoria nasceu com a primeira casa em São Gabriel da Cachoeira, em 1915, e ela cresceu a partir da periferia, dos povos indígenas, em direção aos centros urbanos. Hoje, com 105 anos de presença, avançamos muito no conhecimento e na evangelização. Vemos que os povos indígenas e os não indígenas precisam uns dos outros, se apoiando mutuamente, e esse encontro de culturas é muito bonito e importante”, completa o salesiano.

 

Um pouco de história

O Estado do Amazonas é geograficamente muito amplo e, tradicionalmente, é dividido por seus grandes rios. Em 1914, a Santa Sé confiou aos Salesianos de Dom Bosco (SDB) a Prefeitura Apostólica do Rio Negro e os primeiros salesianos chegaram à região já no ano seguinte, estabelecendo a sede para a nova missão em São Gabriel da Cachoeira, a cerca de 850 quilômetros de Manaus. Logo se espalharam por toda a região, abrindo oratórios, escolas, centros para a juventude e paróquias, sem que fosse deixada de lado a presença missionária entre os indígenas.

 

As Filhas de Maria Auxiliadora (FMA) chegaram à região um pouco depois, em 1923, data em que foi instalada a primeira casa também em São Gabriel. Em 1961, a Inspetoria Laura Vicuña foi oficialmente criada, para atender ao crescente número de obras. Porém, devido às dificuldades causadas pelas distâncias e diversidades entre os estados (Amazonas, Pará e Rondônia), em 1999 foi criada a Inspetoria Santa Teresinha, que desde então se ocupa dos povos do norte do estado do Amazonas. Atualmente, as duas inspetorias FMA estão em processo de reunificação, para fortalecer o trabalho que, assim como no caso dos SDB, também se caracteriza tanto pela missão entre os povos indígenas, como pela pastoral e ação educativa nos centros urbanos.

 

No Alto Rio Negro

As presenças missionárias salesianas entre os povos indígenas da região do Rio Negro e seus afluentes hoje são cinco. Em São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel e Iauaretê – esta última na fronteira com a Colômbia –, a missão é compartilhada entre SDB e FMA e atende 23 etnias indígenas diferentes, com paróquia, oratório, catequese, alguns cursos profissionalizantes e as itinerâncias, que são as visitas às diversas comunidades. Em Maturacá e Marauiá, os SDB trabalham exclusivamente com o povo Yanomami, sendo que em Maturacá existe paróquia e atendimento ao povo nos sacramentos e na itinerância, enquanto Marauiá é uma presença menos estruturada. Nos dois locais, padre Reginaldo ressalta o convênio com o governo do Estado para o apoio aos professores indígenas nas escolas públicas da região.

 

“O trabalho missionário indígena é em primeiro lugar a presença religiosa qualitativa. Consiste em estar com o povo, que tem sua cultura, seus costumes e sua religião própria. É uma experiência de encontro com o outro e, a partir disso, o atendimento e o desenvolvimento em uma ação evangelizadora”, afirma o padre Reginaldo. Segundo ele, um dos grandes desafios da missão salesiana atualmente é o encontro entre o carisma salesiano e o Sistema Preventivo de Dom Bosco, com a espiritualidade e o modo de ser dos povos indígenas. “O grande desafio é esse encontro dos valores para formar uma Igreja autóctone, ou seja, uma Igreja que surge do encontro de duas culturas. Nenhuma cultura tem que se sobrepor, mas sim se entrelaçar. O Sínodo da Amazônia veio reforçar isso, que a Igreja possa expressar seus valores dando os passos para a inculturação”.

 

Nas questões sociais, a atuação salesiana é bastante voltada para a formação e o fortalecimento dos jovens indígenas como protagonistas e o apoio às lideranças. Há também o Centro de Formação Indígena, que funciona atualmente em São Gabriel e é direcionado à experiência formativa para ser um bom cristão e o despertar de vocações, leigas e religiosas. Em relação a estas, atualmente a Inspetoria São Domingos Sávio conta com seis padres indígenas, de cinco povos diferentes, além de jovens indígenas em todas as etapas de formação.

 

Ir. Fermina Lopez, FMA:

51 anos de missão no Rio Negro

A irmã Fermina Lopez Villa, FMA, é natural de Castilla, na Espanha, e há 51 anos é missionária entre os povos indígenas do Rio Negro. Ela conta aos leitores do Boletim Salesiano sua experiência de vida missionária e religiosa, agora vivida em Barcelos, AM.

 

Eu vim da Inspetoria Santa Teresa de Jesus, de Madri, na Espanha. Cheguei em Manaus no dia 12 de outubro de 1969, e desde então fiquei esses mais de 50 anos pelas nossas obras do Rio Negro. Minha vocação vem desde que era pequena e participava do grupo da Infância Missionária na paróquia. Por lá passavam muitos missionários espanhóis, de várias congregações, vindos da África e da América, e a gente escutava suas histórias, cantava seus cantos.

Agora estou em uma pequena cidade na margem do Rio Negro, chamada Barcelos. Aqui temos uma grande escola, a São Francisco de Sales, com 1.008 alunos, e ajudamos na paróquia, nas visitas nos bairros, na periferia. Nos bairros, nos finais de semana, ajudamos as celebrações, reunimos as crianças, os jovens e as famílias, temos o oratório. Na escola, como sou professora aposentada, hoje estou na Pastoral, no desenvolvimento do ensino religioso, nas acolhidas, nas gincanas marianas e no contato direto, nos recreios.

Aqui na região do Rio Negro, desde a fronteira com a Venezuela e a Colômbia até aqui pertinho de Manaus, somos uma presença missionária e salesiana muito forte. São muitos alunos e ex-alunos, muita gente que guarda lembranças do nosso trabalho na educação. Além da escola temos esse acompanhamento, encontros com as crianças e os jovens, e uma participação importante na parte social.

Barcelos tem 12 bairros, em cada um tem uma capela, um campo esportivo, um centro social. Tudo isso foi feito pelos salesianos e salesianas, e se conserva na memória e na vida do povo. Então a importância das missões salesianas está no nosso testemunho, nossa colaboração com os pobres, nesse acompanhamento que fazemos.

O Sistema Preventivo de Dom Bosco, aprendido pelos ex-alunos, é levado também para as outras escolinhas, no interior, ao longo dos rios, pelos professores que são ex-alunos. Quando vêm para a cidade, eles nos pedem livros, materiais, a carta do Reitor-mor, que chega a muitos e muitos professores que tentam continuar o espírito salesiano no trabalho do dia a dia.

 

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Última modificação em Quarta, 28 Outubro 2020 00:45

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Quarta, 28 Outubro 2020 00:41 Escrito por 
Desde 1915, a missão salesiana se desenvolve junto a 23 etnias indígenas na região do Rio Negro e seus afluentes, no extremo norte do país.    

A dimensão missionária salesiana no Brasil tem expressão especialmente na presença entre os povos indígenas. As inspetorias São Domingos Sávio e Missão Salesiana do Mato Grosso, dos Salesianos de Dom Bosco, e Laura Vicunha, Santa Teresinha e Nossa Senhora da Paz, das Filhas de Maria Auxiliadora, são consideradas como missionárias justamente por isso.

 

“O conceito missionário hoje vai além, no sentido de que a missão não tem fronteiras. Mas essas inspetorias são consideradas como missionárias pelo fato de ter um trabalho bem específico com os povos indígenas”, explica o padre Reginaldo Cordeiro, SDB, vice-inspetor e delegado de Animação Missionária da Inspetoria São Domingos Sávio. “A nossa inspetoria nasceu com a primeira casa em São Gabriel da Cachoeira, em 1915, e ela cresceu a partir da periferia, dos povos indígenas, em direção aos centros urbanos. Hoje, com 105 anos de presença, avançamos muito no conhecimento e na evangelização. Vemos que os povos indígenas e os não indígenas precisam uns dos outros, se apoiando mutuamente, e esse encontro de culturas é muito bonito e importante”, completa o salesiano.

 

Um pouco de história

O Estado do Amazonas é geograficamente muito amplo e, tradicionalmente, é dividido por seus grandes rios. Em 1914, a Santa Sé confiou aos Salesianos de Dom Bosco (SDB) a Prefeitura Apostólica do Rio Negro e os primeiros salesianos chegaram à região já no ano seguinte, estabelecendo a sede para a nova missão em São Gabriel da Cachoeira, a cerca de 850 quilômetros de Manaus. Logo se espalharam por toda a região, abrindo oratórios, escolas, centros para a juventude e paróquias, sem que fosse deixada de lado a presença missionária entre os indígenas.

 

As Filhas de Maria Auxiliadora (FMA) chegaram à região um pouco depois, em 1923, data em que foi instalada a primeira casa também em São Gabriel. Em 1961, a Inspetoria Laura Vicuña foi oficialmente criada, para atender ao crescente número de obras. Porém, devido às dificuldades causadas pelas distâncias e diversidades entre os estados (Amazonas, Pará e Rondônia), em 1999 foi criada a Inspetoria Santa Teresinha, que desde então se ocupa dos povos do norte do estado do Amazonas. Atualmente, as duas inspetorias FMA estão em processo de reunificação, para fortalecer o trabalho que, assim como no caso dos SDB, também se caracteriza tanto pela missão entre os povos indígenas, como pela pastoral e ação educativa nos centros urbanos.

 

No Alto Rio Negro

As presenças missionárias salesianas entre os povos indígenas da região do Rio Negro e seus afluentes hoje são cinco. Em São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel e Iauaretê – esta última na fronteira com a Colômbia –, a missão é compartilhada entre SDB e FMA e atende 23 etnias indígenas diferentes, com paróquia, oratório, catequese, alguns cursos profissionalizantes e as itinerâncias, que são as visitas às diversas comunidades. Em Maturacá e Marauiá, os SDB trabalham exclusivamente com o povo Yanomami, sendo que em Maturacá existe paróquia e atendimento ao povo nos sacramentos e na itinerância, enquanto Marauiá é uma presença menos estruturada. Nos dois locais, padre Reginaldo ressalta o convênio com o governo do Estado para o apoio aos professores indígenas nas escolas públicas da região.

 

“O trabalho missionário indígena é em primeiro lugar a presença religiosa qualitativa. Consiste em estar com o povo, que tem sua cultura, seus costumes e sua religião própria. É uma experiência de encontro com o outro e, a partir disso, o atendimento e o desenvolvimento em uma ação evangelizadora”, afirma o padre Reginaldo. Segundo ele, um dos grandes desafios da missão salesiana atualmente é o encontro entre o carisma salesiano e o Sistema Preventivo de Dom Bosco, com a espiritualidade e o modo de ser dos povos indígenas. “O grande desafio é esse encontro dos valores para formar uma Igreja autóctone, ou seja, uma Igreja que surge do encontro de duas culturas. Nenhuma cultura tem que se sobrepor, mas sim se entrelaçar. O Sínodo da Amazônia veio reforçar isso, que a Igreja possa expressar seus valores dando os passos para a inculturação”.

 

Nas questões sociais, a atuação salesiana é bastante voltada para a formação e o fortalecimento dos jovens indígenas como protagonistas e o apoio às lideranças. Há também o Centro de Formação Indígena, que funciona atualmente em São Gabriel e é direcionado à experiência formativa para ser um bom cristão e o despertar de vocações, leigas e religiosas. Em relação a estas, atualmente a Inspetoria São Domingos Sávio conta com seis padres indígenas, de cinco povos diferentes, além de jovens indígenas em todas as etapas de formação.

 

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A irmã Fermina Lopez Villa, FMA, é natural de Castilla, na Espanha, e há 51 anos é missionária entre os povos indígenas do Rio Negro. Ela conta aos leitores do Boletim Salesiano sua experiência de vida missionária e religiosa, agora vivida em Barcelos, AM.

 

Eu vim da Inspetoria Santa Teresa de Jesus, de Madri, na Espanha. Cheguei em Manaus no dia 12 de outubro de 1969, e desde então fiquei esses mais de 50 anos pelas nossas obras do Rio Negro. Minha vocação vem desde que era pequena e participava do grupo da Infância Missionária na paróquia. Por lá passavam muitos missionários espanhóis, de várias congregações, vindos da África e da América, e a gente escutava suas histórias, cantava seus cantos.

Agora estou em uma pequena cidade na margem do Rio Negro, chamada Barcelos. Aqui temos uma grande escola, a São Francisco de Sales, com 1.008 alunos, e ajudamos na paróquia, nas visitas nos bairros, na periferia. Nos bairros, nos finais de semana, ajudamos as celebrações, reunimos as crianças, os jovens e as famílias, temos o oratório. Na escola, como sou professora aposentada, hoje estou na Pastoral, no desenvolvimento do ensino religioso, nas acolhidas, nas gincanas marianas e no contato direto, nos recreios.

Aqui na região do Rio Negro, desde a fronteira com a Venezuela e a Colômbia até aqui pertinho de Manaus, somos uma presença missionária e salesiana muito forte. São muitos alunos e ex-alunos, muita gente que guarda lembranças do nosso trabalho na educação. Além da escola temos esse acompanhamento, encontros com as crianças e os jovens, e uma participação importante na parte social.

Barcelos tem 12 bairros, em cada um tem uma capela, um campo esportivo, um centro social. Tudo isso foi feito pelos salesianos e salesianas, e se conserva na memória e na vida do povo. Então a importância das missões salesianas está no nosso testemunho, nossa colaboração com os pobres, nesse acompanhamento que fazemos.

O Sistema Preventivo de Dom Bosco, aprendido pelos ex-alunos, é levado também para as outras escolinhas, no interior, ao longo dos rios, pelos professores que são ex-alunos. Quando vêm para a cidade, eles nos pedem livros, materiais, a carta do Reitor-mor, que chega a muitos e muitos professores que tentam continuar o espírito salesiano no trabalho do dia a dia.

 

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