“Por cinco decênios, o Mianmar esteve cravado à cruz da injustiça por cinco pregos: ditadura, guerra, deslocamentos forçados, pobreza, opressão. Hoje, uma nova crucificação ameaça a nação, com cinco novos encraves: açambarcamento das terras, corrupção, injustiça econômica, conflitos étnicos e deslocamentos, ódio religioso, violência”, afirma o arcebispo, sem reticências .
Dom Maung Bo não nega os “significativos passos para alentar as restrições e permitir uma sociedade mais aberta”, passos dados nos últimos três anos sob a guia do presidente Thein Sein. Todavia, a nação se encontra “por um fio entre a esperança e o medo”, visto que “a transformação do país está ainda em sua infância” e “o raio de sol, que deixou entrever ao mundo, arrisca ser substituído por nuvens de tempestade”.
Em especial, o prelado salesiano teme um recrudescimento dos controles estatais sobre as liberdades pessoais, a partir da liberdade religiosa, arquitrave das demais liberdades pessoais. Sinal de alarme é em tal sentido a proposta de lei sobre a “proteção da raça e da religião”, que será discutida nos próximos dias pelo Parlamento.
O projeto de lei prevê um autêntico “processo” para obter a licença oficial para converter-se de uma religião a outra. Os funcionários das repartições governativas têm o poder de decidir se um requerente exerceu ou não o livre arbítrio ao optar pela mudança de crença. Quantos pedem a conversão “com o intento de insultar ou destruir outra religião” podem ser punidos com a reclusão de até dois anos; igualmente tentar persuadir uma pessoa com presumida “pressão indébita” importa um ano de prisão.
Por isso, um fórum de mais de 80 organizações da sociedade civil de todo o mundo já pediu oficialmente ao governo do Mianmar que arquive essa proposta de lei, sustentada ao invés por grupos radicais budistas, como o “Movimento 969”.
Visto o crescente extremismo nacionalista-religioso, que já causou “horríveis violências” de que foram vítimas nos últimos anos, sobretudo as comunidades muçulmanas de etnia ‘rohingya’, Dom Maung Bo convida toda a Comunidade Internacional a falar abertamente, a fim de contrastar os “discursos do ódio” com discursos de paz; e exorta os seus compatriotas a fazer valer os conceitos de bondade, de compaixão, de paz e de fraternidade, próprios do Budismo, do Islã, do Cristianismo.