Quando se conclui o primeiro e mais árduo trecho do caminho

Segunda, 09 Mai 2016 21:31 Escrito por 
“A persistência é o caminho do êxito” (Charles Chaplin) O trabalho de conclusão de curso, o famoso TCC que sempre exige mais dos alunos em uma graduação, no caso de Ana Carolina Caceres está dando o que falar no mundo todo. A jovem de 25 anos formou-se em Jornalismo no final do ano passado pela Universidade Católica Dom Bosco – UCDB, em Mato Grosso do Sul, mas o diferencial de sua história é que ela nasceu com microcefalia.

Apesar dos percalços de uma infância que exigiu dela e da família muitos cuidados médicos, a jovem sempre se aplicou nos estudos e é o tipo de pessoa que não desiste. “Tanto é que uma das minhas frases preferidas é essa, do Charles Chaplin. Vivencio a persistência desde que nasci”, comemora entusiasmada.

Desde novembro de 2015, um pouco antes da colação de grau, a Campo Grande News se interessou pela história descrita no TCC da jovem. O irmão dela, que trabalha no jornal, levou o TCC para a redação e nasceu assim a primeira reportagem sobre essa história de superação. Depois vieram as demais mídias locais e de lá para o G1, TV Globo e, por fim, a BBC, que se incumbiu de propagar a história de Ana Carolina mundialmente. Desde então, a rotina da “foca” – jargão jornalístico para jornalistas recém-formados – tem sido intensa. Ela se diz “acostumada” com essa dinâmica, mas a mãe, que não é do ramo, estranhou bastante.

“Eu era estudante de Direito, mas acompanhando a trajetória do Marcelo Tás, fui me encantando com o Jornalismo”, lembra Ana Carolina. “A vocação já tinha se refletido na minha nota do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), no qual conquistei 970 pontos em redação. O tema era ‘Maioridade Penal’ e eu encerrei com uma citação de Pitágoras – ‘Educai as crianças para que não preciseis punir os homens’”, relembra ela.

 

Sua história

Ana Carolina nasceu com um bem e um grande desafio. O bem é a família, que se empenhou em todos os sentidos para que seu crescimento pudesse se dar com o mínimo possível de problemas. Seu desafio foi o diagnóstico de microcefalia, que exigiu inúmeras intervenções cirúrgicas, sendo a primeira aos nove dias de nascimento. Era necessário extrair uma parte frontal do osso craniano, para liberar o desenvolvimento da massa encefálica. A ausência da proteção óssea demandou zelo redobrado na infância, para evitar quedas. “Bola, muitas crianças e situações de multidão eram vistos como riscos. Não aprendi a andar de bicicleta e até hoje tomo cuidado quando estou em grande concentração de pessoas”, observa.

“A microcefalia não tem uma causa exata, e no meu caso pode ser genética. Ninguém pode prever como será o desenvolvimento de uma criança. Aqui em Campo Grande conheço as irmãs Patrícia e Adriana, de 20 e 14 anos, ambas com microcefalia, que são atletas. Jogam tênis de mesa adaptado e disputam corrida. No quarto delas há inúmeras medalhas, conquistadas em competições”, conta Ana.

Nenhum exame pré-natal identificou a má formação durante a gestação. O diagnóstico se deu no terceiro dia de nascimento. Foram mais cinco cirurgias na infância. “Quase todo ano eu fazia uma nova, para conter a calcificação da caixa craniana e deixar o desenvolvimento do cérebro”, explica. “Houve muitas sessões de fisioterapia até os dois anos. Tive convulsões que me exigiram medicação apropriada até os 14”. Mas Ana ressalta que nunca perdeu ano letivo, porque as cirurgias eram sempre realizadas em período de férias.

 

De olho no futuro

A recém-formada é entusiasmada ao contar sua história e depois de um período intenso de entrevistas, agora ela está de olho no que vem pela frente. O TCC virou livro graças ao apoio da UCDB. “Depois de publicar meu livro, quero colocar em prática tudo que aprendi na faculdade. Quero me especializar no Jornalismo, mas quero fazer Letras e Fisioterapia Ocupacional, como plano B para a profissão”.

Ana Carolina está segura de que tem todas as condições para enfrentar o mercado de trabalho. Na faculdade, o curso coloca o aluno para praticar o que a teoria ensina. “Lá a gente tem uma estrutura boa, os professores são prestativos e a dinâmica do curso coloca a gente em contato direto com o mercado de trabalho”, ressalta. “Temos atividades pertinentes a todas as mídias, direção de TV, edição, criação, para a parte eletrônica e, na parte impressa, além de editar e escrever, a gente ainda distribui o jornal impresso na cidade”.

 

Conselho

Nos últimos meses, um número crescente de bebês com o diagnóstico da microcefalia vem preocupando as autoridades no Brasil e no mundo. Há a suspeita de que o zika vírus, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, seja o causador desse fenômeno. Para as mães que tiveram seus filhos com esse diagnóstico, Ana Carolina tem uma mensagem extraída da poesia de Fernando Sabino, uma de suas preferidas:

“De tudo ficaram três coisas

A certeza de que estamos começando

A certeza de que é preciso continuar

A certeza de que podemos ser interrompidos

antes de terminar

Façamos da interrupção um caminho novo

Da queda, um passo de dança

Do medo, uma escada

Do sonho, uma ponte

Da procura, um encontro!”

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Última modificação em Quarta, 11 Mai 2016 14:45

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Quando se conclui o primeiro e mais árduo trecho do caminho

Segunda, 09 Mai 2016 21:31 Escrito por 
“A persistência é o caminho do êxito” (Charles Chaplin) O trabalho de conclusão de curso, o famoso TCC que sempre exige mais dos alunos em uma graduação, no caso de Ana Carolina Caceres está dando o que falar no mundo todo. A jovem de 25 anos formou-se em Jornalismo no final do ano passado pela Universidade Católica Dom Bosco – UCDB, em Mato Grosso do Sul, mas o diferencial de sua história é que ela nasceu com microcefalia.

Apesar dos percalços de uma infância que exigiu dela e da família muitos cuidados médicos, a jovem sempre se aplicou nos estudos e é o tipo de pessoa que não desiste. “Tanto é que uma das minhas frases preferidas é essa, do Charles Chaplin. Vivencio a persistência desde que nasci”, comemora entusiasmada.

Desde novembro de 2015, um pouco antes da colação de grau, a Campo Grande News se interessou pela história descrita no TCC da jovem. O irmão dela, que trabalha no jornal, levou o TCC para a redação e nasceu assim a primeira reportagem sobre essa história de superação. Depois vieram as demais mídias locais e de lá para o G1, TV Globo e, por fim, a BBC, que se incumbiu de propagar a história de Ana Carolina mundialmente. Desde então, a rotina da “foca” – jargão jornalístico para jornalistas recém-formados – tem sido intensa. Ela se diz “acostumada” com essa dinâmica, mas a mãe, que não é do ramo, estranhou bastante.

“Eu era estudante de Direito, mas acompanhando a trajetória do Marcelo Tás, fui me encantando com o Jornalismo”, lembra Ana Carolina. “A vocação já tinha se refletido na minha nota do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), no qual conquistei 970 pontos em redação. O tema era ‘Maioridade Penal’ e eu encerrei com uma citação de Pitágoras – ‘Educai as crianças para que não preciseis punir os homens’”, relembra ela.

 

Sua história

Ana Carolina nasceu com um bem e um grande desafio. O bem é a família, que se empenhou em todos os sentidos para que seu crescimento pudesse se dar com o mínimo possível de problemas. Seu desafio foi o diagnóstico de microcefalia, que exigiu inúmeras intervenções cirúrgicas, sendo a primeira aos nove dias de nascimento. Era necessário extrair uma parte frontal do osso craniano, para liberar o desenvolvimento da massa encefálica. A ausência da proteção óssea demandou zelo redobrado na infância, para evitar quedas. “Bola, muitas crianças e situações de multidão eram vistos como riscos. Não aprendi a andar de bicicleta e até hoje tomo cuidado quando estou em grande concentração de pessoas”, observa.

“A microcefalia não tem uma causa exata, e no meu caso pode ser genética. Ninguém pode prever como será o desenvolvimento de uma criança. Aqui em Campo Grande conheço as irmãs Patrícia e Adriana, de 20 e 14 anos, ambas com microcefalia, que são atletas. Jogam tênis de mesa adaptado e disputam corrida. No quarto delas há inúmeras medalhas, conquistadas em competições”, conta Ana.

Nenhum exame pré-natal identificou a má formação durante a gestação. O diagnóstico se deu no terceiro dia de nascimento. Foram mais cinco cirurgias na infância. “Quase todo ano eu fazia uma nova, para conter a calcificação da caixa craniana e deixar o desenvolvimento do cérebro”, explica. “Houve muitas sessões de fisioterapia até os dois anos. Tive convulsões que me exigiram medicação apropriada até os 14”. Mas Ana ressalta que nunca perdeu ano letivo, porque as cirurgias eram sempre realizadas em período de férias.

 

De olho no futuro

A recém-formada é entusiasmada ao contar sua história e depois de um período intenso de entrevistas, agora ela está de olho no que vem pela frente. O TCC virou livro graças ao apoio da UCDB. “Depois de publicar meu livro, quero colocar em prática tudo que aprendi na faculdade. Quero me especializar no Jornalismo, mas quero fazer Letras e Fisioterapia Ocupacional, como plano B para a profissão”.

Ana Carolina está segura de que tem todas as condições para enfrentar o mercado de trabalho. Na faculdade, o curso coloca o aluno para praticar o que a teoria ensina. “Lá a gente tem uma estrutura boa, os professores são prestativos e a dinâmica do curso coloca a gente em contato direto com o mercado de trabalho”, ressalta. “Temos atividades pertinentes a todas as mídias, direção de TV, edição, criação, para a parte eletrônica e, na parte impressa, além de editar e escrever, a gente ainda distribui o jornal impresso na cidade”.

 

Conselho

Nos últimos meses, um número crescente de bebês com o diagnóstico da microcefalia vem preocupando as autoridades no Brasil e no mundo. Há a suspeita de que o zika vírus, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, seja o causador desse fenômeno. Para as mães que tiveram seus filhos com esse diagnóstico, Ana Carolina tem uma mensagem extraída da poesia de Fernando Sabino, uma de suas preferidas:

“De tudo ficaram três coisas

A certeza de que estamos começando

A certeza de que é preciso continuar

A certeza de que podemos ser interrompidos

antes de terminar

Façamos da interrupção um caminho novo

Da queda, um passo de dança

Do medo, uma escada

Do sonho, uma ponte

Da procura, um encontro!”

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