A tríplice fonte de Dom Bosco

Sexta, 22 Julho 2016 16:05 Escrito por  Pe. Marcos Sandrini, SDB
A tríplice fonte de Dom Bosco Nino Musio
Dom Bosco educador alimenta sua espiritualidade, isto é, sua paixão pela vida e pelo Senhor da vida, em uma tríplice fonte. Inspirado por ele, também o educador alimenta sua espiritualidade nessas mesmas fontes.

A primeira das fontes de Dom Bosco é a presença no meio do povo, sobretudo no mundo dos jovens. Há coisas que não são aprendidas em livro nenhum. Só a vida é quem ensina. Só se compreende um menino, um adolescente e um jovem conversando, dialogando e convivendo com ele. Assim é na família, assim é na escola, assim é na vida. Há coisas e situações que só se aprendem se nos deixarmos encharcar por elas. Um menino e uma menina excluídos soltam um grito de ajuda para o educador e a educadora. É um grito silencioso, mas é um grito. Quantas pessoas não falam nada com a boca, mas sua situação é um apelo contundente? Estes são profetas que não falam, mas sua vida é a grande Palavra.

O educador comprometido com seu povo não é um alienado, porque conhece a vida desse povo. Nossas respostas de vida devem responder à pergunta, insistente, que cada dia Deus nos faz: “Onde dormirão os pobres nesta noite?” (Ex 22,26). Um educador e uma educadora que já perderam o contato físico e espiritual com as novas gerações, principalmente com os mais pobres e excluídos, vão ensinar o quê? Em um país de muitos miseráveis, tudo o que somos e temos é para os pobres e excluídos.

Educar é ser presente, é encontrar-se. Essa presença se torna marcante quando o educador e a educadora são marcantes. Os encontros de Jesus foram marcantes. Assim foi com Mateus, com a samaritana, com as crianças, com os discípulos de Emaús, com cada um dos apóstolos, inclusive Judas. Ninguém se aproximou de Jesus e continuou igual. Cada um mudou de vida.

Quem lê a vida de Dom Bosco com profundidade percebe que ele se identificou com Jesus Cristo. Ninguém se aproximou dele e saiu como chegou. Há o encontro de Dom Bosco com Domingos Sávio. Ao entrar no escritório de Dom Bosco, ele deparou com a frase bíblica: “Dai-me vidas, levai o resto”. A partir daí, São Domingos Sávio entregou-lhe sua alma para que, bom mestre, a esculpisse para ficar mais de acordo com o projeto de Deus. Dom Orione, um de seus ex-alunos mais ilustres e que dele aprendeu a amar dos pobres os mais pobres, disse: “Caminharia sobre brasas para ver Dom Bosco mais uma vez e poder lhe dizer obrigado”. Todo evangelizador e educador marca a vida de seus educandos com sua própria personalidade, tal como Dom Bosco. Muitos de nós, também, um dia nos encontramos com Dom Bosco e nunca mais fomos os mesmos...

 

Por vós estudo...

Outra fonte de alimentação da mística e da espiritualidade salesiana é o estudo. Nenhum educador consegue compreender sozinho o alcance de uma realidade que tem desdobramentos sociais, políticos, econômicos, culturais e religiosos. Participar de grupos de reflexão e ONGs, e colocar-se em atitude de formação permanente, são exigências espirituais.

Mesmo que se diga que é prazeroso estudar, no entanto o mais das vezes isso exige um esforço muito grande por parte do educador. Disciplinar-se para estudar, para produzir textos, para não repetir o óbvio e o senso comum exige disciplina e humildade profundas. Um educador precisa saber fazer uma distinção entre o urgente e o necessário. O urgente é a aula de amanhã, o menino que incomoda, os pais que exigem, a incompreensão da coordenação pedagógica, o salário insuficiente. O necessário é a perspectiva de vida que se passa com a gurizada, a projeção da utopia e do horizonte ideal, o diuturno trabalho para revolucionar as metodologias de apassivadoras e acomodadoras, mudando-as para ativas e inovadoras.

Há uma expressão de Dom Bosco que é muito citada entre os salesianos: “Eu por vós estudo”. O amor ao estudo aparece em João Bosco, que consegue conjugar suas tarefas campestres com os livros e o estudo; se exprime nos momentos e tempos que consegue dedicar à sua formação, mesmo depois de sua ordenação sacerdotal; e também no seu programa educativo (santidade, estudo, piedade). “O estudo e a piedade te tornarão um verdadeiro salesiano”. Cultura e espiritualidade tornarão você um autêntico e competente educador-pastor dos jovens. O estudo nunca será um aspecto marginal de nossa missão. Ele pode assumir formas e expressões diferentes, segundo as aptidões e os dons pessoais, mas será sempre uma das condições para encarnar o amor para com os jovens, que dá significado a toda a nossa existência.

A perspectiva do estudo, hoje, é muito diferente da de outros tempos. Primeiro, porque assume o caráter de formação continuada. Não se trata de encher a cabeça de ideias e teorias para gastar na prática. Em estudo não há um agora e um depois. Há sempre um agora. Há momentos mais intensos de síntese, mas a vida é um estudo continuado. Depois, tudo na vida tem uma dimensão transdisciplinar. Não basta mais se especializar em uma área. É preciso aprender a transitar pelos vários saberes e pelas várias práticas.

 

Experiência de Deus

A terceira fonte que alimenta a mística é o encontro pessoal com o Deus da Vida na oração, na meditaçãoe na contemplação. Educar é tornar possível o surgimento do novo. Há uma antiga versão do salmo 42 que diz: “Irei ao altar de Deus, do Deus que renova a minha juventude”. A experiência de Deus na oração não é somente uma ocasião que o educador tem para apresentar a Deus suas inquietudes e necessidades pessoais. É, sobretudo, a oportunidade que concede a Deus para que lhe fale e lhe faça conhecer a sua vontade. A experiência de Deus é sempre uma janela aberta por onde entra um ar novo e refrescante e, ao mesmo tempo, é uma porta aberta por onde entram novas pessoas e novos desafios.

Feliz o educador que se abre às inspirações do Espírito Santo de Deus. Ele é a fonte da ciência e da sabedoria. Educador sábio é aquele que faz de sua profissão uma missão. Não há pessoa mais feliz no mundo que o educador. Ele tem plateia garantida. Ao sair de casa, sabe que haverá sempre alguém para acolhê-lo, escutá-lo e, até, rejeitá-lo. A intimidade com o Espírito Santo de Deus, através da oração e da meditação, ajudará o educador a transformar todas as situações, inclusive as mais desafiadoras, em vivências transformadoras de vida.

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Última modificação em Sábado, 14 Março 2020 13:41

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A tríplice fonte de Dom Bosco

Sexta, 22 Julho 2016 16:05 Escrito por  Pe. Marcos Sandrini, SDB
A tríplice fonte de Dom Bosco Nino Musio
Dom Bosco educador alimenta sua espiritualidade, isto é, sua paixão pela vida e pelo Senhor da vida, em uma tríplice fonte. Inspirado por ele, também o educador alimenta sua espiritualidade nessas mesmas fontes.

A primeira das fontes de Dom Bosco é a presença no meio do povo, sobretudo no mundo dos jovens. Há coisas que não são aprendidas em livro nenhum. Só a vida é quem ensina. Só se compreende um menino, um adolescente e um jovem conversando, dialogando e convivendo com ele. Assim é na família, assim é na escola, assim é na vida. Há coisas e situações que só se aprendem se nos deixarmos encharcar por elas. Um menino e uma menina excluídos soltam um grito de ajuda para o educador e a educadora. É um grito silencioso, mas é um grito. Quantas pessoas não falam nada com a boca, mas sua situação é um apelo contundente? Estes são profetas que não falam, mas sua vida é a grande Palavra.

O educador comprometido com seu povo não é um alienado, porque conhece a vida desse povo. Nossas respostas de vida devem responder à pergunta, insistente, que cada dia Deus nos faz: “Onde dormirão os pobres nesta noite?” (Ex 22,26). Um educador e uma educadora que já perderam o contato físico e espiritual com as novas gerações, principalmente com os mais pobres e excluídos, vão ensinar o quê? Em um país de muitos miseráveis, tudo o que somos e temos é para os pobres e excluídos.

Educar é ser presente, é encontrar-se. Essa presença se torna marcante quando o educador e a educadora são marcantes. Os encontros de Jesus foram marcantes. Assim foi com Mateus, com a samaritana, com as crianças, com os discípulos de Emaús, com cada um dos apóstolos, inclusive Judas. Ninguém se aproximou de Jesus e continuou igual. Cada um mudou de vida.

Quem lê a vida de Dom Bosco com profundidade percebe que ele se identificou com Jesus Cristo. Ninguém se aproximou dele e saiu como chegou. Há o encontro de Dom Bosco com Domingos Sávio. Ao entrar no escritório de Dom Bosco, ele deparou com a frase bíblica: “Dai-me vidas, levai o resto”. A partir daí, São Domingos Sávio entregou-lhe sua alma para que, bom mestre, a esculpisse para ficar mais de acordo com o projeto de Deus. Dom Orione, um de seus ex-alunos mais ilustres e que dele aprendeu a amar dos pobres os mais pobres, disse: “Caminharia sobre brasas para ver Dom Bosco mais uma vez e poder lhe dizer obrigado”. Todo evangelizador e educador marca a vida de seus educandos com sua própria personalidade, tal como Dom Bosco. Muitos de nós, também, um dia nos encontramos com Dom Bosco e nunca mais fomos os mesmos...

 

Por vós estudo...

Outra fonte de alimentação da mística e da espiritualidade salesiana é o estudo. Nenhum educador consegue compreender sozinho o alcance de uma realidade que tem desdobramentos sociais, políticos, econômicos, culturais e religiosos. Participar de grupos de reflexão e ONGs, e colocar-se em atitude de formação permanente, são exigências espirituais.

Mesmo que se diga que é prazeroso estudar, no entanto o mais das vezes isso exige um esforço muito grande por parte do educador. Disciplinar-se para estudar, para produzir textos, para não repetir o óbvio e o senso comum exige disciplina e humildade profundas. Um educador precisa saber fazer uma distinção entre o urgente e o necessário. O urgente é a aula de amanhã, o menino que incomoda, os pais que exigem, a incompreensão da coordenação pedagógica, o salário insuficiente. O necessário é a perspectiva de vida que se passa com a gurizada, a projeção da utopia e do horizonte ideal, o diuturno trabalho para revolucionar as metodologias de apassivadoras e acomodadoras, mudando-as para ativas e inovadoras.

Há uma expressão de Dom Bosco que é muito citada entre os salesianos: “Eu por vós estudo”. O amor ao estudo aparece em João Bosco, que consegue conjugar suas tarefas campestres com os livros e o estudo; se exprime nos momentos e tempos que consegue dedicar à sua formação, mesmo depois de sua ordenação sacerdotal; e também no seu programa educativo (santidade, estudo, piedade). “O estudo e a piedade te tornarão um verdadeiro salesiano”. Cultura e espiritualidade tornarão você um autêntico e competente educador-pastor dos jovens. O estudo nunca será um aspecto marginal de nossa missão. Ele pode assumir formas e expressões diferentes, segundo as aptidões e os dons pessoais, mas será sempre uma das condições para encarnar o amor para com os jovens, que dá significado a toda a nossa existência.

A perspectiva do estudo, hoje, é muito diferente da de outros tempos. Primeiro, porque assume o caráter de formação continuada. Não se trata de encher a cabeça de ideias e teorias para gastar na prática. Em estudo não há um agora e um depois. Há sempre um agora. Há momentos mais intensos de síntese, mas a vida é um estudo continuado. Depois, tudo na vida tem uma dimensão transdisciplinar. Não basta mais se especializar em uma área. É preciso aprender a transitar pelos vários saberes e pelas várias práticas.

 

Experiência de Deus

A terceira fonte que alimenta a mística é o encontro pessoal com o Deus da Vida na oração, na meditaçãoe na contemplação. Educar é tornar possível o surgimento do novo. Há uma antiga versão do salmo 42 que diz: “Irei ao altar de Deus, do Deus que renova a minha juventude”. A experiência de Deus na oração não é somente uma ocasião que o educador tem para apresentar a Deus suas inquietudes e necessidades pessoais. É, sobretudo, a oportunidade que concede a Deus para que lhe fale e lhe faça conhecer a sua vontade. A experiência de Deus é sempre uma janela aberta por onde entra um ar novo e refrescante e, ao mesmo tempo, é uma porta aberta por onde entram novas pessoas e novos desafios.

Feliz o educador que se abre às inspirações do Espírito Santo de Deus. Ele é a fonte da ciência e da sabedoria. Educador sábio é aquele que faz de sua profissão uma missão. Não há pessoa mais feliz no mundo que o educador. Ele tem plateia garantida. Ao sair de casa, sabe que haverá sempre alguém para acolhê-lo, escutá-lo e, até, rejeitá-lo. A intimidade com o Espírito Santo de Deus, através da oração e da meditação, ajudará o educador a transformar todas as situações, inclusive as mais desafiadoras, em vivências transformadoras de vida.

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