Educar no Sistema Preventivo hoje

Sábado, 04 Julho 2015 16:54 Escrito por  Prof. Dr. Wellington de Oliveira
O Sistema Preventivo é a raiz do espírito salesiano. Ele se configura, ao mesmo tempo, pedagogia, pastoral e espiritualidade. É desta visão, e dos fundamentos antropológicos e teológicos, que parte a concepção de Dom Bosco a respeito da educação. Neste sentido, educar é promover o desenvolvimento integral da pessoa, cultivando todas as suas dimensões. É tornar mais fácil à criança e ao jovem a realização dos valores que os humanizam e os personalizam. É neste duplo embate que se desenvolve a ação educativa salesiana, no empenho para ajudar os jovens a se tornarem pessoas, fazendo-os cada vez mais se assemelharem ao Criador, que nos fez, ao mesmo tempo, únicos e originais por uma parte, iguais e irmãos por outra. O grande desafio de toda ação educativa é encontrar o equilíbrio entre a humanização e a personalização, a fim de que os jovens conservem esse mesmo equilíbrio por toda a vida. Dom Bosco percebeu que, para conseguir isso, era preciso uma presença amiga junto aos jovens, praticando uma educação que fosse além da instrução.

Uma instituição educativa salesiana precisa crer que é pelo conjunto do curriculo que se chega a concretizar esta maneira de conceber a educação. Dar um sentido evangélico a toda a realidade humana, partindo de conteúdos distintos e de disciplinas escolares, é o meio mais eficaz, ao mesmo tempo, de educar e de evangelizar e, assim, cumprir a missão.

Educar no Sistema Preventivo compreende um agir organizado da escola no mundo, que se caracteriza pelo cuidado na condução do processo de educação e evangelização, para que este se desenvolva de forma sistematizada, orgânica, progressiva e permanente, apropriando-se de metodologias diversificadas, com a finalidade de tornar a mensagem cristã significativa e eficaz em realidades e públicos específicos.

Por isso, as escolas salesianas tornam-se espaços nos quais os conhecimentos são partilhados, confrontados, sistematizados, constituídos em sabedoria, e colocados a serviço da vida para formação de um ser humano integral e de uma sociedade justa, ética e solidária, tendo o Evangelho como referência. Desta forma, ao lado do empenho pela excelência profissional-acadêmica, para a realização de nossa missão, cabe a nós (educadores, religiosos, leigos, famílias) priorizar alguns posicionamentos evangélico-pastorais:

 

Comunidade acadêmica

Nossos colégios, faculdades e obras sociais devem se empenhar permanentemente por constituírem-se em comunidades nas quais o Evangelho e o carisma salesiano sejam traduzidos à linguagem e aos desafios acadêmicos. Estes elementos são vitais e orientam permanentemente os seguintes âmbitos: o ideal de ser humano e de sociedade; nosso jeito de educar, de pesquisar, de aprender e de partilhar o conhecimento; nossos processos pedagógicos, de planejamento, de formação e avaliação; nossos posicionamentos políticos, opções estratégicas e sociais; nosso jeito de administrar, de conviver e de se relacionar com a pluralidade; nosso jeito de celebrar e de dar sentido à vida em suas diversas dimensões.

 

Dinamizar a relação da fé com a cultura

Nossa comunidade acadêmica precisa centrar esforços para a promoção, articulação e dinamização do diálogo entre Fé, Ciência e Cultura, considerando as diversas áreas de conhecimento. Com isso, ela poderá oferecer ao público acadêmico, à sociedade e à Igreja, de forma coerente e atualizada, reflexões devidamente fundamentadas sobre limites e possibilidades entre fé e razão e sobre os desafios relacionados à defesa da vida, sobretudo da infância e da juventude. Nesse processo, o currículo torna-se o lugar por excelência da promoção do diálogo entre fé e ciência.

Em todo seu empenho educativo, nossos colégios, faculdades e obras sociais consideram como sua riqueza maior os jovens e valorizam o seu potencial de transformação da sociedade. Desta forma, sob a inspiração do legado de Dom Bosco e Madre Mazzarello, garantimos espaços de reflexão, debate, intercâmbios de experiências, participação e protagonismo social, com a finalidade de gerar lideranças jovens criativas, empreendedoras, com consciência cristã solidária, sensibilidade ecológica e comprometimento sociotransformador.

 

Extensão do conhecimento

Nossas comunidades acadêmicas devem se dedicar à busca da verdade e estar comprometidas com a justiça. A diversidade dos saberes constitui-se em práxis que consolida-se a serviço da dignidade do ser humano e da sua libertação integral. Por isso, estendem os conhecimentos produzidos em seus seios à sociedade e à Igreja, por meio de eventos formativos, projetos socioeducativos emancipatórios e missões “além fronteira”.

Nossos colégios, faculdades e obras sociais precisam estar em comunhão com as dioceses locais e, por meio delas, oferecer a seus membros a dinamização dos sacramentos, da liturgia e orientação espiritual, cultivando a sabedoria que fundamenta nossa ação educativa. Neste contexto, às comunidades educativas cabe celebrar as ocasiões significativas para o fortalecimento de sua cultura e missão, bem como sintonizar-se com o Ano Litúrgico como fonte de vitalidade e esperança.

 

Palavras que não são finais...

Nossos colégios, faculdades e obras sociais, para serem disseminadores do carisma salesiano, não podem estar indiferentes aos aspectos atuais da humanidade, aos sinais dos tempos. Ler e inserir-se no contexto dos sujeitos para conhecê-los em suas potencialidades e fraquezas se faz essencial para que a missão seja fecunda, visto que sem sintonia social, não há processos de conhecer e investigar que estejam a serviço da comunidade humana.

Sem a premissa da sintonia social nossas escolas se eximem de denunciar as fraquezas de seu tempo e de profetizar uma Boa Nova sensível à realidade e com potencial para transformá-la. Este é um desafio premente, inclusive o Documento de Aparecida nos convoca a todos, Escola e Igreja, a passarmos de uma pastoral de conservação para uma pastoral missionária, a passar de uma fé de tradição a uma fé de convicção.

Nossos colégios, faculdades e obras sociais tornam-se, então, lugar privilegiado para a ação da Igreja, pois é nela que se consolidam as identidades profissionais e pessoais de muitos jovens líderes da sociedade. Liderança ética com competência profissional é primordial para a formação integral a que se dedicam nossas escolas. Em uma sociedade que se demonstra “líquida” é inquietante pensar em solidez ética para as gerações, frutos de uma realidade onde as relações configuram-se instantaneamente e, por conseguinte, são fluidas.

O desafio que se impõe a nós, hoje, é reconhecer as diferentes nuances do Sistema Preventivo e agir para que os jovens conheçam, compreendam e interpretem, com base no carisma salesiano, o contexto de vida das pessoas, acompanhando-as e por vezes fazendo a mudança das estruturas para responder às dores daqueles sujeitos históricos que adentram a comunidade educativa, ação que requer uma nova e profunda espiritualidade.

 

Desenvolvimento na comunidade

O propósito maior da educação no Sistema Preventivo deve centrar-se em fundir o desenvolvimento espiritual com aquilo que se aprende e produz na escola, a fim de aplicar no desenvolvimento de uma comunidade.

Comunidade esta, que tem participação ativa e contribui com a instituição que a beneficia, passando-lhe experiências da vida real, dando crédito a seus experimentos e justificando o que se realiza nas áreas de ensino e pesquisa. De modo geral, essa relação entre escola e comunidade contribui efetivamente para a melhoria da sociedade e possibilita que estudantes, professores, pais e familiares envolvidos enriqueçam seu saber ao mesmo tempo em que contribuem para o crescimento das pessoas e comunidades que estão envolvidas com esses atores acadêmicos.

Finalizando, o Sistema Preventivo, enquanto projeto educativo, necessita criar relações para compreensão de que uma instituição de ensino também está conectada à reapropriação do vivido como espaço de significação na vida cotidiana do encontro com Deus.

 

Wellington de Oliveira é pós-doutor em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-SP. Diretor da Rede Salesiana de Escolas, no Instituto Coração de Jesus, nas Faculdades Integradas Teresa D’Ávila – FATEA e nas Faculdades Integradas Coração de Jesus - FAINC, em São Paulo.

 

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Educar no Sistema Preventivo hoje

Sábado, 04 Julho 2015 16:54 Escrito por  Prof. Dr. Wellington de Oliveira
O Sistema Preventivo é a raiz do espírito salesiano. Ele se configura, ao mesmo tempo, pedagogia, pastoral e espiritualidade. É desta visão, e dos fundamentos antropológicos e teológicos, que parte a concepção de Dom Bosco a respeito da educação. Neste sentido, educar é promover o desenvolvimento integral da pessoa, cultivando todas as suas dimensões. É tornar mais fácil à criança e ao jovem a realização dos valores que os humanizam e os personalizam. É neste duplo embate que se desenvolve a ação educativa salesiana, no empenho para ajudar os jovens a se tornarem pessoas, fazendo-os cada vez mais se assemelharem ao Criador, que nos fez, ao mesmo tempo, únicos e originais por uma parte, iguais e irmãos por outra. O grande desafio de toda ação educativa é encontrar o equilíbrio entre a humanização e a personalização, a fim de que os jovens conservem esse mesmo equilíbrio por toda a vida. Dom Bosco percebeu que, para conseguir isso, era preciso uma presença amiga junto aos jovens, praticando uma educação que fosse além da instrução.

Uma instituição educativa salesiana precisa crer que é pelo conjunto do curriculo que se chega a concretizar esta maneira de conceber a educação. Dar um sentido evangélico a toda a realidade humana, partindo de conteúdos distintos e de disciplinas escolares, é o meio mais eficaz, ao mesmo tempo, de educar e de evangelizar e, assim, cumprir a missão.

Educar no Sistema Preventivo compreende um agir organizado da escola no mundo, que se caracteriza pelo cuidado na condução do processo de educação e evangelização, para que este se desenvolva de forma sistematizada, orgânica, progressiva e permanente, apropriando-se de metodologias diversificadas, com a finalidade de tornar a mensagem cristã significativa e eficaz em realidades e públicos específicos.

Por isso, as escolas salesianas tornam-se espaços nos quais os conhecimentos são partilhados, confrontados, sistematizados, constituídos em sabedoria, e colocados a serviço da vida para formação de um ser humano integral e de uma sociedade justa, ética e solidária, tendo o Evangelho como referência. Desta forma, ao lado do empenho pela excelência profissional-acadêmica, para a realização de nossa missão, cabe a nós (educadores, religiosos, leigos, famílias) priorizar alguns posicionamentos evangélico-pastorais:

 

Comunidade acadêmica

Nossos colégios, faculdades e obras sociais devem se empenhar permanentemente por constituírem-se em comunidades nas quais o Evangelho e o carisma salesiano sejam traduzidos à linguagem e aos desafios acadêmicos. Estes elementos são vitais e orientam permanentemente os seguintes âmbitos: o ideal de ser humano e de sociedade; nosso jeito de educar, de pesquisar, de aprender e de partilhar o conhecimento; nossos processos pedagógicos, de planejamento, de formação e avaliação; nossos posicionamentos políticos, opções estratégicas e sociais; nosso jeito de administrar, de conviver e de se relacionar com a pluralidade; nosso jeito de celebrar e de dar sentido à vida em suas diversas dimensões.

 

Dinamizar a relação da fé com a cultura

Nossa comunidade acadêmica precisa centrar esforços para a promoção, articulação e dinamização do diálogo entre Fé, Ciência e Cultura, considerando as diversas áreas de conhecimento. Com isso, ela poderá oferecer ao público acadêmico, à sociedade e à Igreja, de forma coerente e atualizada, reflexões devidamente fundamentadas sobre limites e possibilidades entre fé e razão e sobre os desafios relacionados à defesa da vida, sobretudo da infância e da juventude. Nesse processo, o currículo torna-se o lugar por excelência da promoção do diálogo entre fé e ciência.

Em todo seu empenho educativo, nossos colégios, faculdades e obras sociais consideram como sua riqueza maior os jovens e valorizam o seu potencial de transformação da sociedade. Desta forma, sob a inspiração do legado de Dom Bosco e Madre Mazzarello, garantimos espaços de reflexão, debate, intercâmbios de experiências, participação e protagonismo social, com a finalidade de gerar lideranças jovens criativas, empreendedoras, com consciência cristã solidária, sensibilidade ecológica e comprometimento sociotransformador.

 

Extensão do conhecimento

Nossas comunidades acadêmicas devem se dedicar à busca da verdade e estar comprometidas com a justiça. A diversidade dos saberes constitui-se em práxis que consolida-se a serviço da dignidade do ser humano e da sua libertação integral. Por isso, estendem os conhecimentos produzidos em seus seios à sociedade e à Igreja, por meio de eventos formativos, projetos socioeducativos emancipatórios e missões “além fronteira”.

Nossos colégios, faculdades e obras sociais precisam estar em comunhão com as dioceses locais e, por meio delas, oferecer a seus membros a dinamização dos sacramentos, da liturgia e orientação espiritual, cultivando a sabedoria que fundamenta nossa ação educativa. Neste contexto, às comunidades educativas cabe celebrar as ocasiões significativas para o fortalecimento de sua cultura e missão, bem como sintonizar-se com o Ano Litúrgico como fonte de vitalidade e esperança.

 

Palavras que não são finais...

Nossos colégios, faculdades e obras sociais, para serem disseminadores do carisma salesiano, não podem estar indiferentes aos aspectos atuais da humanidade, aos sinais dos tempos. Ler e inserir-se no contexto dos sujeitos para conhecê-los em suas potencialidades e fraquezas se faz essencial para que a missão seja fecunda, visto que sem sintonia social, não há processos de conhecer e investigar que estejam a serviço da comunidade humana.

Sem a premissa da sintonia social nossas escolas se eximem de denunciar as fraquezas de seu tempo e de profetizar uma Boa Nova sensível à realidade e com potencial para transformá-la. Este é um desafio premente, inclusive o Documento de Aparecida nos convoca a todos, Escola e Igreja, a passarmos de uma pastoral de conservação para uma pastoral missionária, a passar de uma fé de tradição a uma fé de convicção.

Nossos colégios, faculdades e obras sociais tornam-se, então, lugar privilegiado para a ação da Igreja, pois é nela que se consolidam as identidades profissionais e pessoais de muitos jovens líderes da sociedade. Liderança ética com competência profissional é primordial para a formação integral a que se dedicam nossas escolas. Em uma sociedade que se demonstra “líquida” é inquietante pensar em solidez ética para as gerações, frutos de uma realidade onde as relações configuram-se instantaneamente e, por conseguinte, são fluidas.

O desafio que se impõe a nós, hoje, é reconhecer as diferentes nuances do Sistema Preventivo e agir para que os jovens conheçam, compreendam e interpretem, com base no carisma salesiano, o contexto de vida das pessoas, acompanhando-as e por vezes fazendo a mudança das estruturas para responder às dores daqueles sujeitos históricos que adentram a comunidade educativa, ação que requer uma nova e profunda espiritualidade.

 

Desenvolvimento na comunidade

O propósito maior da educação no Sistema Preventivo deve centrar-se em fundir o desenvolvimento espiritual com aquilo que se aprende e produz na escola, a fim de aplicar no desenvolvimento de uma comunidade.

Comunidade esta, que tem participação ativa e contribui com a instituição que a beneficia, passando-lhe experiências da vida real, dando crédito a seus experimentos e justificando o que se realiza nas áreas de ensino e pesquisa. De modo geral, essa relação entre escola e comunidade contribui efetivamente para a melhoria da sociedade e possibilita que estudantes, professores, pais e familiares envolvidos enriqueçam seu saber ao mesmo tempo em que contribuem para o crescimento das pessoas e comunidades que estão envolvidas com esses atores acadêmicos.

Finalizando, o Sistema Preventivo, enquanto projeto educativo, necessita criar relações para compreensão de que uma instituição de ensino também está conectada à reapropriação do vivido como espaço de significação na vida cotidiana do encontro com Deus.

 

Wellington de Oliveira é pós-doutor em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-SP. Diretor da Rede Salesiana de Escolas, no Instituto Coração de Jesus, nas Faculdades Integradas Teresa D’Ávila – FATEA e nas Faculdades Integradas Coração de Jesus - FAINC, em São Paulo.

 

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