São Francisco de Sales foi proclamado protetor dos jornalistas pelo Papa Pio IX e “celeste patrono de todos os escritores católicos” pelo Papa Pio XI em 25 de janeiro de 1933.
No ocidente, deste o século VI até o início do século XIX, se usava a pena ganso ou de outras aves para escrever. São Francisco de Sales e Dom Bosco as usaram para exercer o “apostolado da pena”. Impulsionados pelo “da mihi animas”, pelo zelo da glória de Deus e da salvação das almas, escreveram obras que tinham como objetivo propagar a sã doutrina. Desta maneira, se colocavam próximos às pessoas, as encorajavam nos momentos difíceis, resolviam dúvidas e estimulavam para o bem, esclareciam posições e situações diversas.
Nas Memórias do Oratório, Dom Bosco explica por que escolheu Francisco de Sales como patrono. Um dos motivos é este: “Outra razão era a de colocar-nos sob sua proteção a fim de que do céu nos ajudasse a imitá-lo no combate aos erros contra a religião, especialmente do protestantismo, que começava a insinuar-se insidiosamente nos nossos povoados e sobretudo na cidade de Turim”. Por isso Dom Bosco irá se colocar no mundo da comunicação, usando e escrevendo livros como um “meio divino”. Não nos esqueçamos que Dom Bosco teve um grande sucesso no campo editorial e no apostolado da boa imprensa.
Francisco de Sales foi um grande escritor. Escreveu pelo dever da sua vocação e para o serviço pastoral. Os escritos nasceram do seu agir e se orientaram à ação pastoral, baseados no Evangelho. Portanto, não escreveu no intuito de aparecer como um “grande escritor”. Numa carta a Joana de Chantal, ele revela justamente isso: “Estou escrevendo um livro sobre o amor de Deus, e tratarei de escrevê-lo em meu coração enquanto o escrevo no papel”. Mesmo assim, suas Obras Completas ocupam 27 volumes, compostos pelos seus nove livros, pregações e cartas.
Para entender a natureza e a correlação das Obras de São Francisco de Sales, é necessário estudá-las em paralelo com a história da sua vida. O santo bispo de Genebra foi essencialmente comunicativo, e pode-se dizer dele, talvez mais do que de qualquer outro Doutor da Igreja, que seus escritos fluem espontaneamente de suas ações e dos acontecimentos cujo curso se entrelaçou com o de sua existência.
Programa de vida e de crescimento espiritual
O livro que se tornou “best seller” foi Introdução à vida devota, mais conhecido popularmente como Filoteia. Francisco tinha escrito várias cartas de direção espiritual para a senhora de Charmoisy, sua parente. Esta senhora mostrou as cartas para o seu confessor, o padre jesuíta Jean Fourier. Este, lendo as cartas, percebeu que se poderia escrever um livro com as orientações de Sales e assim contribuir para que mais pessoas pudessem ter acesso a esse “tesouro espiritual”. Escrevendo para Francisco de Sales, perguntou: “Sr. Bispo, como fazemos para imprimir o tesouro de devoção da senhora de Charmoisy? Haveria necessidade, no meu parecer, ...rever tudo, organizar, intitular, colocar um prefácio com o nome do Autor, para que o bem seja mais bem assegurado e seja mais universal”. E assim nasceu Introdução à vida devota, um dos livros do cristianismo mais vendidos até os dias de hoje. A primeira edição é de 1609.
No prefácio do livro, Francisco diz o seguinte: “Dirijo minhas palavras a Filoteia, porque, querendo que seja útil a muitas almas aquilo que tinha escrito para uma só alma, chamo, com este nome comum a quantas queiram empreender o caminho da devoção, pois Filoteia quer dizer ‘amante e enamorada de Deus’”.
A grande originalidade do livro foi divulgar a ideia de que a santidade é para todos os cristãos. Francisco escreveu esse livro não para religiosos, mas para leigos, que viviam no meio do mundo. Apresentando-se ao público por meio de Filoteia, Francisco de Sales renovou um apelo que quase ninguém mais se recordava: “A devoção se coaduna a todas as vocações e profissões”. E se empenhou em trabalhar para a santidade de todos: leigos, consagrados e eclesiásticos, infundindo nas mentes e nos corações do povo de Deus a convicção de que todos podem chegar a altos níveis da santidade.
Um livro para o amor divino
O outro livro famoso que Francisco escreveu foi o Tratado do amor de Deus, ou Teótimo. Foi publicado em 1616. No prefácio do livro, Francisco de Sales explica o objetivo: “Eu tenho em vista apresentar simples e singelamente, sem arte e ainda mais sem artifício, a história ao nascimento, ao progresso, da decadência, das operações, propriedades, vantagens e excelências do amor divino”.
Ele explica também a escolha do nome: “Teótimo, a quem me dirijo, é o próprio espírito humano, que deseja fazer progressos no amor de Deus, espírito que está igualmente nas mulheres como nos homens... Este Tratado é feito para ajudar a alma já devota a aperfeiçoar-se”.
Outros escritos
Quando Francisco estava em missão no Chablais protestante, escreveu folhas com a doutrina católica, sem atacar os ensinamentos calvinistas. De noite ele colocava essas folhas debaixo das portas das casas. Na sua canonização, essas folhas foram ajuntadas e surgiu assim um “livro” póstumo, chamado de Controvérsias. Ainda durante a missão, escreveu O Estandarte da Santa Cruz. Trata-se de uma defesa da cruz de Cristo, contra os ensinamentos calvinistas que atacavam o fato dos católicos “adorarem” a cruz.
Outra obra póstuma é Conversas Espirituais. Trata-se de um livro composto pelas conversas que Francisco tinha com as Irmãs da Visitação. Elas faziam perguntas, quando ele as visitava, e ele ia respondendo. Elas anotavam as respostas. E assim, em 1629, surgiu este livro.
As cartas são muito interessantes para o estudo da figura de Francisco de Sales. Nelas, ele se revela. Cerca de 2.100 cartas chegaram até nós. Vemos nelas o homem privado, as relações familiares e de amizade, o patriota e o cidadão. As Cartas de São Francisco de Sales são um fundo inesgotável de doutrina. Se ele é acima de tudo o mestre consumado da ascese e, aqui e ali, da mística, também encontramos nessas cartas o teólogo perfeito, através da certeza de suas decisões e da exposição luminosa e límpida de alguns de nossos dogmas católicos.
Os editores da sua obra escreveram sobre suas cartas: “Somente ali encontraremos sua verdadeira e completa fisionomia: razão firme e luminosa, julgamento penetrante, simplicidade de coração unido ao bom senso prático, amplitude de visão, franqueza temperada por uma benevolência sorridente, fina bonomia tão alegremente aliada à alta distinção do cavalheiro e do Prelado, fidelidade ao solo nativo, devoção à família, ternura infalível nas amizades, orgulho legítimo do nome e da raça, amor sem limites a Deus e às almas, todo animado e santificado pela superabundância da graça : em uma palavra, um espécime raro e soberbo de humanidade e de santidade”.
São Paulo VI definiu Francisco de Sales como “uma das maiores figuras da Igreja e da história”. Lendo seus escritos, percebemos a verdade dessa afirmação. Mas Francisco de Sales foi grande porque soube aproveitar tudo o que pudesse para evangelizar as pessoas do seu tempo, fazendo dos seus escritos um “apostolado da pena” que teve grande êxito, graças ao zelo do “da mihi animas” que inundava todo o seu ser.