No Pai Nosso não há traço de prolixidade. Os pedidos são breves, as palavras são concisas e o seu conteúdo é de uma profundidade abissal. Com esta oração, Jesus desejou ensinar-nos como Deus deseja receber a oração. Indica o modo correto ou, se assim o desejar, a disposição interior com a qual devemos estar diante de Deus.
O Pai Nosso é uma oração rica de conteúdo. São Cipriano o considera um “compêndio da doutrina celeste”, onde “nada foi esquecido daquilo que sabemos e podemos pedir”, seja referindo-se a Deus ou em relação ao homem (De dominica oratione, 8). Devemos, portanto, considerá-la uma oração completa em si mesma.
Também é necessário notar que o conteúdo do Pai Nosso é exigente. As suas invocações são expressas com os verbos no imperativo, que evocam o senso de responsabilidade para colher o seu significado e a convicção com a qual devemos pronunciá-la.
Enfim, o “ousamos dizer” com o qual a liturgia eucarística nos introduz na récita do Pai Nosso, nos recorda que somos as criaturas diante de Deus Criador. A consciência de sermos filhos no Seu Filho nos dá a coragem de colocar-nos diante do Pai para invocar-lhe apoio. Essa coragem deriva da obediência às palavras do Senhor, que mantém viva a nossa fé, alimenta a nossa esperança e solicita o exercício da nossa caridade.
Oração composta por Jesus Cristo para os discípulos
A oração do Senhor, aquela transmitida por Jesus aos discípulos, é uma só. E é assim, porque é dirigida diretamente a Ele.
A palabra Abbá, Pai, ilumina toda a oração de Jesus. É uma confidência, própria do idioma familiar aramaico, que expressa a simplicidade do menino que se dirige a um pai que vela, cura, sustenta e o prepara para enfrentar as provas da vida. Esta invocação nos lábios de Jesus revela a sua filiação divina e a total entrega de sua vida na obediência ao Pai. Percorrendo o Evangelho, descobre-se que na oração de Jesus estão presentes todas as formas de oração: aquela de louvor e de agradecimento e a do abandono em Deus e a de requisição da libertação da angústia.
Além disso, não há invocação do Pai Nosso que não encontre o “seu correspondente” no ensinamento e no comportamento de Jesus, exceto o pedido do perdão. Como Verbo de Deus encarnado, Jesus não conhece a culpa. Ele foi enviado para carregar os pecados dos homens e tendo-lhes sempre perdoado, a afirmação “como perdoamos a quem nos tem ofendido” encontra Nele plenitude de verdade. Se como cristãos desejamos cultivar em nós “os mesmos sentimentos de Jesus Cristo” (Fil 2,5), a sua oração é aquela que pode nos induzir a sintonizar sempre melhor o seu ensinamento e comportamento.
“Senhor, ensina-nos a orar” (Lc 11,1)
Jesus preocupou-se com a oração dos seus discípulos, recomendando-lhes que não somente orassem muito e com persistência, mas condescendeu em compor para eles uma oração para dirigir-se ao Pai. A palavra Abbá, Pai, que flui do profundo ser do Filho de Deus feito homem, deve também informar e marcar nossas vidas de filhos de Deus. Pelo Espírito Santo, nos dirigimos ao Pai com ânimo filial. Nós O invocamos para que estenda o Seu Reino da verdade e da graça a todos os lugares e que este Reino encontre em nós o acolhimento merecido até o dia em que poderemos contemplar, em uma visão bem-aventurada, a Sua volta.
No Pai Nosso, Jesus orienta o nosso olhar em direção ao céu, mas fala também das necessidades fundamentais para a existência humana: o pão de cada dia, o perdão, a superação das tentações e a libertação do mal. Insistimos para que se crie em nós condições para poder construir a nossa vida de filhos de Deus e, assim, colocar nossa energia a serviço do amor de Deus e ao próximo, sempre imersos no grande projeto divino. Os pedidos que Jesus nos propõe no Pai Nosso não têm o objetivo de orar a Deus à vontade, mas de elevar-nos às alturas da Sua paterna vontade para que a possamos intuir, adorar e compreender.
“Específica” do Pai Nosso é a pessoa de Jesus, centro da fé cristã
Do Evangelho de Mateus (6, 5-7) e de Lucas (11,1) resulta que a fórmula de oração ensinada por Jesus distingue os seus discípulos de outros grupos religiosos: dos hipócritas, dos pagãos e dos seguidores de João Batista. Todavia não deve surpreender o fato de que também um hebreu, um muçulmano ou um fiel de outra religião, estando de acordo com os requisitos elementares do Pai Nosso, possa adotar esta oração sem reservas.
Mas se o que se deseja é colher o “específico”, isto é, a novidade e a originalidade do Pai Nosso, não se pode ignorar Jesus. A novidade do Novo Testamento é Jesus Cristo e, mesmo que no Pai Nosso não se fale explicitamente Dele, o seu conteúdo é em essência cristológico, porque o seu ensinamento não pode ser desvinculado da intencionalidade que guiou a sua vida inteira de Verbo encarnado nas lutas pela santificação no nome de Deus. Na récita do Pai Nosso, nós, cristãos, não podemos colocar entre parênteses a nossa fé no Filho de Deus, que se fez homem para salvação da humanidade.