A Bíblia nos conta que Deus se revelou a Moisés, e que Ele o chamou para libertar os israelitas da escravidão no Egito, dizendo: “Eu sou o Deus do teu pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac, o Deus de Jacó”. Ao pedido de Moisés para revelar-lhe o seu nome, responde: “Eu sou aquele que sou” (Ex 3,1-14). Deus não expressa um nome, mas afirma a existência com “Aquele que existe desde sempre”, “Aquele que está aqui e age”, como parece simbolizar também a palavra Yhwh, adotada pelos israelitas para dizer Deus. Deus, por iniciativa própria, oferece a Moisés a possibilidade de escutar a Sua voz, o chama para desenvolver uma missão libertadora a favor do povo de Israel, mas não lhe revela o Seu nome nem permite que O veja. Não se pode definir quem é Deus com palavras humanas, enclausurando Sua identidade no âmbito das nossas categorias mentais. Ele permanece sempre o Outro, o diferente do homem, que nunca poderá compreendê-Lo totalmente nem possuí-Lo. Todavia, Deus se revela a Moisés como aquele que quer estar presente às suas criaturas, manifestar a sua força salvadora e socorrer-lhes.
Santificação do nome de Deus
Pelo pensamento semita o nome se identificava com a pessoa. Na verdade, o nome é um apelido que é imposto como sinal de reconhecimento. Isso não revela quem se é, todavia oferece a possibilidade de comunicação com o outro, de chamá-lo e de manter um diálogo. Isso pode ajudar-nos a compreender o que devemos pretender, quando se chama Deus pelo nome. Jesus nos ensinou a atribuir a Deus o nome de Pai. Um nome que com referência à paternidade diz mais do que o simples lado externo de Deus e algo de novo sobre sua vida intra trinitária e sua relação de presença e comunhão com os homens.
O melhor comentário sobre o primeiro pedido do Pai Nosso se encontra na oração sacerdotal que Jesus dirigiu ao Pai, antes da sua Paixão (Jo 17). Jesus pede ao Pai que glorifique o próprio nome e também o do Filho “com aquela glória que havia tomado” Dele “antes que o mundo fosse”, para que o Filho o glorifique, graças ao cumprimento da obra que foi por Ele confiada (Jo 17, 1-3). Aqui Pai e Filho interagiram em uma reciprocidade de amor. Disso, segue-se que Jesus glorifica o nome do Pai com a sua morte na cruz, e o Pai glorifica o Filho com a ressurreição e exaltação após a morte.
Na mesma oração sacerdotal, Jesus pede ao Pai para santificar os discípulos na verdade, por isso se santifica em favor deles na obediência ao Pai (Jo 17,17-19). Esta santificação une a Deus e, ao mesmo tempo, separa do mundo. É necessário, todavia, esclarecer que tal separação não deriva da fidelidade a Deus, mas se manifesta como fidelidade ao mundo que deseja salvar. A fidelidade a Deus impõe ao discípulo viver separado do mundo da injustiça, da violência e do pecado, se deseja ser transparente ao amor de Deus.
Só Deus é santo
Através da sua revelação progressiva, Deus, ao qual são atribuídos vários nomes, apesar de misterioso e indefinível, quis manifestar-se e aproximar-se dos homens para salvá-los, envolvendo-os na sua santidade. No Antigo Testamento, “santo” é um termo que pode ser aplicado de modo exclusivo e somente a Deus e revela a dimensão inefável do seu mistério. A santidade de Deus se expressa como glória, isto é, como poder do amor que opera a salvação. Deus atendeu a Israel de várias maneiras. Livra-o da escravidão, o purifica de todas as impurezas, o escolhe como seu povo e com a aliança oferece-lhe participação em sua vida e no seu ser. Por isso, o povo de Israel é convidado por Deus a caminhar “na Sua estrada” e a observar a Sua lei (Dt 16, 17-19), a ser santo como Ele é santo (Lv 19, 2) para poder participar da santidade divina e testemunhá-la. Glória, salvação e santidade se interligam na Bíblia. Assim, a palavra “glória” assume o significado de salvação e santificação do homem por parte de Deus, e a glorificação de Deus pelo homem, que obedece aos seus comandos. Israel não poderia nunca afirmar a sua nova identidade de povo santo, se Deus não a tivesse oferecido por pura graça.
Implicações desta santificação
O pedido de santificação do nome de Deus exprime muitas coisas. Antes de tudo, a invocação ressoa como um convite a reconhecer a glória e a santidade de Deus que transparecem da criação e da redenção. E assim como somente Deus é o Santo que purifica, regenera, renova e habilita as pessoas a serem santas e testemunhas de santidade, o sujeito principal desta obra sacrificadora é Deus, não o homem. Isto nos impele a pedir que seja Ele mesmo a manifestar e a comunicar a sua santidade, fazendo de modo que a salvação realizada pelo Seu Filho alcance toda a humanidade, nos santifique, introduzindo-nos de algum modo no seu próprio ser.
Esta santificação nos transporta para fora da lógica do mundo e nos impele a refutar os aspectos da vida diferentes à vontade de Deus. Na medida em que nos deixamos transformar por ela, estamos em situação de poder respeitar, orar, invocar, louvar, exaltar e glorificar o nome de Deus como um dever, isto é, de santificá-lo. Considerando, porém, a nossa fraqueza, devemos estar sempre muito atentos a não abusar do nome de Deus e não profaná-lo com palavras e com uma conduta deplorável.
Como cristãos, se desejamos de verdade colaborar com a santificação do nome de Deus, nada nos resta além de nos empenharmos em acolher o amor de Deus derramado em nossos corações por meio do Espírito Santo, e a vivê-lo em tal reciprocidade de fraternidade que permita distinguir nos envolvimentos da nossa vida e nas nossas atitudes o rosto do verdadeiro Deus, que é um Deus de harmonia, de solidariedade e de paz. Como membros ativos e responsáveis da Igreja, que é o lugar de encontro e de comunhão do povo de Deus, devemos manifestar claramente tudo o que Deus já realizou em nós. Diante do nome santo de Deus, devemos orar com a Igreja: “Te louva, Senhor, a nossa voz, te louva o nosso espírito, como o nosso ser é dono do teu amor, toda a nossa vida se transforma em perpétua liturgia de louvor”. Santifica-nos, Senhor, para que o Seu santo nome seja glorificado pela coerência cristã, no nosso modo de viver e realizar.
Padre Agostino Favale, SDB, é professor emérito de História da Igreja Moderna e Contemporânea e de Espiritualidade da Universidade Pontifícia Salesiana de Roma, consultor da Congregação para a Causa dos Santos e autor de mais de 180 obras. Tradução: Elaine Tozetto.