O célebre pensamento do grande mestre brasileiro no campo da pedagogia, Paulo Freire, aponta uma verdade que reconhecemos também na tradição educativa que acontece nos espaços salesianos. Dom Bosco, que das mais variadas formas buscou responder às diferentes carências dos adolescentes e jovens que viviam a exclusão e a marginalidade nas ruas de Turim, na segunda metade do século XIX, possuía igual clareza. Preocupado em oferecer aos seus jovens moradia, pão, formação profissional, lazer e cultura, não quis, contudo, que seus seguidores fossem vistos como agentes sociais, mas, de forma clara, os definiu como “educadores de jovens”.
Transformar a realidade a partir da educação pressupõe um bem elaborado processo de formação da personalidade das pessoas que compõem a sociedade. Quando educamos crianças para que cresçam de forma sadia, imbuídas de valores e atitudes pautados pelo respeito ao outro, pela solidariedade, pelo sentido de corresponsabilidade com o bem comum, temos adultos conscientes, emocionalmente saudáveis e equilibrados, capazes de estabelecer relações harmoniosas e positivas.
Processo educativo
Sempre carregamos conosco o peso que nos é imposto pela nossa condição de seres humanos falíveis e limitados, e pelos elementos do temperamento que herdamos com a nossa genética. Essa é a condição natural na qual nascemos. O ambiente familiar, as relações estabelecidas com o entorno dos nossos vizinhos, a convivência e os aprendizados decorrentes do ingresso na creche, na escola e em outros espaços educativos, vão moldando nossa personalidade e nos ajudando a construir o nosso caráter.
Tudo, assim, se constitui como um caminho ou um processo educativo que vai nos acompanhando da mais tenra idade em nossa infância – quando começamos a nos alimentar no seio materno – até a maturidade da nossa condição de adultos ou mesmo na etapa que hoje se convencionou reconhecer como a melhor idade. Estamos permanentemente em formação, sempre educando e nos deixando educar.
Fraternidade e Educação
A Campanha da Fraternidade (CF), importante movimento de reflexão e conscientização que a Igreja desencadeia todos os anos, a partir do início do tempo quaresmal (mas que não se limita a esse período), neste ano de 2022 está chamando nossa atenção justamente para o tema da educação. Com o lema tirado do livro dos Provérbios, a CF 2022 assim nos motiva: “Fala com sabedoria, ensina com amor” (Pr 31, 26). Para além de ressaltar a importância da ação educativa, já parte nos orientando sobre o modo de como exercer esta prática, ou seja, com conteúdos pautados em orientações profundas (com sabedoria) e com atitudes que expressem bondade, respeito, cuidado (com amor). Nada mais necessário em tempos de “fake news” e violência.
Por uma feliz coincidência, ou pelas pequenas delicadezas da graça de Deus, nós Salesianos (consagrados, consagradas ou simples admiradores do carisma) fomos brindados também em 2022 pela celebração dos 400 anos da morte de São Francisco de Sales, de quem herdamos o nome de Salesianos, e pela carta do Reitor-mor, padre Ángel Fernández Artime, que, inspirado em nosso Santo Patrono, chamou a atenção para o tema: “Fazei tudo por amor, nada por força” (São Francisco de Sales).
Apoiados por uma e outra reflexão, em nossa missão de educar somos sempre convidados a perceber, com maior clareza, a grandeza e a importância do trabalho que realizamos em diferentes e variadas formas de espaços educativos: obras sociais, escolas, universidades, paróquias. Em cada um deles, nossa atenção se volta para as famílias, que, em uma sociedade complexa como a nossa, se sentem por vezes desorientadas na forma de como conduzir a educação dos filhos e das filhas. Se dirige igualmente às crianças, aos adolescentes e aos jovens, que crescem hoje num mundo onde nem sempre são claras as referências que devem pautar o desenvolvimento harmonioso e sadio de quem vive etapas de crescimento e desenvolvimento.
Comprometidos com a missão
Em todo esse trabalho, sobremaneira nos contextos de grandes vulnerabilidades sociais, com maiores dificuldades e menores oportunidades, os desafios trazidos exigem um empenho especial dos educadores para “redescobrir caminhos para uma reconstrução que não é parcial, mas global; que não atinge somente alguns aspectos, mas que deve chegar às raízes do modo como pessoas e povos compreendem e organizam a totalidade da vida” (CF p. 10). Trata-se de um árduo trabalho no qual a educação é chamada a contribuir na superação das “marcas do pecado” (desigualdade, fome, falta de cuidado com a saúde, violência) e, ao mesmo tempo, a investir na vida, formar a consciência e construir relações de fraternidade, altruísmo e respeito.
Para complementar e aprofundar o que aqui já foi trazido, vale lembrar o que nos diz o Papa Francisco na Carta Encíclica Laudato Si chamando a atenção para a necessidade de uma educação integral e que forme pessoas abertas ao cuidado com a “casa comum”: “A educação será ineficaz e os seus esforços estéreis se não se preocupar também por difundir um novo modelo relativo ao ser humano, à vida, à sociedade e à relação com a natureza” (LS 215). Despertar as novas gerações para o cuidado e a preservação dos bens naturais é, com certeza, uma forma de comprometê-las ainda mais com o bem e a felicidade de todos os que habitam o nosso planeta.
Por fim, considerando a grandeza da ação educativa e o quanto é imprescindível que nos sintamos comprometidos nessa nobre missão, com à qual Dom Bosco queria contar com a participação de todas as forças vivas da sociedade, unidas num vasto movimento, vamos “falar com a sabedoria” do provérbio africano que sustenta que: “é necessária a aldeia inteira para educar uma criança”. Sinta-se, portanto, particularmente convidado. Dedique-se a transmitir amor, bondade e acolhida a toda criança, todo adolescente e todo jovem. E, se puder, apoie a ação educativa dos projetos sociais salesianos por meio da União Pela Vida.
Padre Agnaldo Soares Lima, SDB, é assessor da Rede Salesiana Brasil de Ação Social (RSB-Social).