A preservação da língua materna indígena se tornou uma preocupação mundial. O padre Tiago Figueiró, salesiano pesquisador do tema, explica que a Missão Salesiana de Mato Grosso enfrenta esse desafio desde o início da presença entre o Povo Bororo em 1895 e entre os Xavante em 1957. A diversidade cultural dos povos encontra na língua seu maior patrimônio.
Projeto inovador une tradição e inteligência artificial
O ex-aluno da Pontifícia Universidade Salesiana de Roma, doutor Fabrício Ferraz Gerardi, apresentou um projeto linguístico inovador em 4 de setembro de 2025. Figueiró relata que a reunião ordinária da Associação dos Cultores da História Salesiana – Seção Brasil (ACSSA Brasil) recebeu a proposta. O projeto dá continuidade ao trabalho de sistematização, preservação e ensino das línguas Bororo e Xavante. Novas tecnologias e inteligência artificial fazem parte do método.
Pioneirismo na documentação linguística
A Missão Salesiana de Mato Grosso publicou em 1908 a obra “Elementos de Grammatica e Diccionário da língua dos Boróros”. O pesquisador salesiano conta que a Exposição Nacional no Rio de Janeiro recebeu o trabalho apenas seis anos após o contato com os Bororo Orientais.
A missão apresentou a bela linguagem com que os Bororo se expressam. A colaboração etnográfica e linguística nasceu de um longo e rigoroso trabalho de convivência com as comunidades indígenas.
Padre Tiago destaca que os salesianos escutaram os falantes e aprenderam diretamente a língua materna. O registro sistemático documentou usos, estruturas e significados. A Enciclopédia Bororo constitui um marco na história da documentação linguística e cultural indígena no Brasil. Pesquisadores das áreas de linguística, antropologia, etnologia e educação indígena consultam a obra até hoje.
O cuidado metodológico e a fidelidade às fontes indígenas caracterizam o trabalho. O respeito à complexidade simbólica, social e cosmológica do povo Bororo se manifesta em cada página. A obra se configura como patrimônio documental a serviço da preservação da memória, da língua e da identidade do povo.
Educação escolar indígena ganha estrutura permanente
A Missão Salesiana de Mato Grosso se tornou a primeira referência para educação escolar Bororo e Xavante. O padre Tiago Figueiró informa que o Conselho Indigenista Missionário e a Operação Amazonia Nativa (OPAN) promoveram o envolvimento do Estado em cursos de professores indígenas para o magistério. Os Projetos Tucum e Raiô abriram caminho para conquistas posteriores. O Estado de Mato Grosso criou a Universidade do Estado de Mato Grosso em 1993. O Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena surgiu em 1995. A Faculdade Indígena Intercultural da Unemat iniciou as atividades em 1997.
ONU declara década das línguas indígenas
A Organização das Nações Unidas declarou os anos de 2022 a 2032 como a Década Internacional das Línguas Indígenas. A UNESCO coordena a iniciativa. Figueiró afirma que a relevância é imensa para o Brasil e para o Estado de Mato Grosso. O estado abriga 43 povos indígenas. Os povos falam 41 línguas distintas. O Estado brasileiro precisa coordenar ações permanentes.
O pesquisador salesiano relata que a presença missionária junto aos Bororo e Xavante produziu em 2022 o documento “Juntos na Missão”. O texto sublinha a necessidade do aprendizado da língua materna por parte dos Bororo e do português por parte dos Xavante.
O documento valoriza o “patrimônio cultural do povo com sua língua, corpo, alma e símbolos”. A comunidade deve se envolver na “criação, com ousadia e criatividade, de um método de aprendizado das línguas xavante, bororo e português”. O texto possibilita o “conhecimento e divulgação da história, língua e cultura, mitos e religiões” desses povos.
Especialistas internacionais assessoram projeto
A Missão Salesiana convidou em 2022 o professor Fabrício Ferraz Gerardi para assessorar um caminho inovador. O ex-aluno de Dom Bosco é doutor em linguística computacional. Gerardi pesquisa e leciona na Universidade de Tübingen, na Alemanha. O professor doutor Ivan Roksandic da Universidade de Winnipeg, no Canadá, se juntou ao projeto em 2024.
A Secretaria de Educação do Estado promoveu em parceria com a Missão Salesiana a formação de professores Bororo entre 2024 e 2025. O doutor Fabrício apresentou no II Seminário de Língua Materna Indígena em 2025 o tema “Novas tecnologias para estudo de línguas indígenas e educação”. A apresentação abordou o uso da inteligência artificial.
Políticas públicas avançam em proteção linguística
A Portaria do MEC nº 539 de 24 de julho de 2025 homologou a Política Nacional de Educação Escolar Indígena nos Territórios Etnoeducacionais. A Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso recebeu em 25 de junho de 2024 uma proposta de lei. O projeto institui uma Política Estadual de Proteção das Línguas Indígenas de Mato Grosso. A Missão Salesiana promoverá em parceria com o Estado uma câmara temática em 5 de fevereiro de 2026. O encontro discutirá as plataformas digitais para a educação indígena.
Plataformas digitais transformam ensino de línguas
As plataformas digitais para educação linguística já são uma realidade em construção. O padre Tiago Figueiró explica que a inteligência artificial apoia a documentação, a formação de professores, o ensino e a produção de materiais didáticos bilíngues. As comunidades Bororo, Xavante, Enawene-Nawe, Pareci e Rikbaktsa utilizam os recursos. O Conselho Indigenista Missionário e a Faculdade Católica de Mato Grosso são parceiros consolidados do projeto.
Por: Euclides Fernandes
Missão Salesiana de Mato Grosso